Black Mirror – A tecnologia é nossa desgraça
Eu já declarei meu fanatismo por séries inglesas diversas vezes neste querido, amado e educado site. Porém, nada me surpreendeu mais do que Black Mirror, cujo o nome remete à uma tela desligada. A forma como nos é jogado na cara que não passamos de um bando de bostas completamente dominados pela tecnologia é de deixar qualquer um puto da vida, mas por fim, temos que concordar que é a mais pura verdade.
Black Mirror é uma série inglesa criada por Charlie Brooker e possui, até o momento, 2 temporadas com narrativas antológicas com 3 episódios cada. A 1° temporada, na minha opinião, é a melhor, com destaque ao 2° episódio, mas vamos por partes. Eu gostaria de poder discutir a moral das histórias aqui com vocês de forma mais ampla, mas isso estragaria a surpresa que eu quero que vocês tenham ao fim de cada episódio. O episódio de estréia, chamado The National Anthem, mostra o drama do primeiro ministro britânico, que para impedir que a princesa seja executada por sequestradores, precisa cumprir a bizarra exigência de transar ao vivo com uma porca às 16:00 horas. Mas qual o real objetivo dos sequestradores, ridicularizar as autoridades britânicas ou conseguir poder? Temos um final aberto a interpretações, mas eu fico com o poder.
O 2° episódio, o melhor de toda a série, chama-se 15 Million Merits, e em um futuro estranho, critica nosso modo de vida. Trabalhamos como filhos da puta pra gastarmos tudo com tecnologia, comida ruim e roupas caras [Para nós ou para nossos avatares]. E às vezes, quando dispostos a algo diferente, tentamos o tudo ou nada para que nossas vidas mudem, e aqui eles aproveitam e mandam uma crítica na cara de programas como Got Talent e em cantoras que deixam seu dom de lado para venderem produtos com seus corpos, além de deixar claro como nos vendemos em troca de uma vida melhor. O discurso final de Daniel Kaluuya é sensacional, é digno de Michael Douglas em Um Dia de Fúria e serviu pra mostrar que o moleque é um dos melhores atores que existem atualmente. Confiram outros trabalhos de Kaluuya em Psychoville, Skins e The Fades. O 3° e último episódio da 1° temporada, chamado The Entire History Of You, que conta a história de um advogado desempregado muito observador, sendo capaz de pegar detalhes que ninguém mais nota e que começa a achar que sua mulher o traiu. Seria apenas mais uma história sobre desconfiança se eles não vivessem em um futuro onde suas memórias são gravadas em um aparelho chamado o grão, que lhes permite rever suas lembranças e exibi-las em televisões para quem mais quiser ver. Uma dica, a ignorância é uma benção.
A 2° temporada começa com Be Right Back, onde uma mulher, após perder seus marido, é apresentada a uma tecnologia bizarra que, através de acesso às redes sociais e e-mails do falecido, envia mensagens para a viúva como se fosse o próprio defunto. Tudo piora quando chega uma atualização do programa onde, com acesso à vídeos, o programa liga para a viúva imitando a voz do morto e as próximas atualizações só pioram tudo, principalmente quando ela descobre que está grávida. Este é de longe o pior episódio da série. O 2° episódio, White Bear, é o mais assustador da série. Victoria, interpretada por Lenora Crichlow de Being Human, desperta no quarto de uma casa, amarrada à uma cadeira, com frascos de remédios caídos pelos chão e a TV a sua frente exibe uma estranha imagem. Após se soltar, ela sai da casa e vê algumas pessoas filmando-a com seus celulares de dentro de suas casas, e tudo piora quando um cara usando uma mascara com o mesmo símbolo que estava na TV e armado com uma espingarda começa a caçar Victoria, que grita por ajuda, mas as pessoas nas ruas nada fazem além de filmar todo o sofrimento da jovem. Inicialmente acreditamos que o episódio seria uma crítica clara aos atuais cinegrafistas de celular, que ao verem qualquer coisa bizarra acontecendo, primeiro filmam para depois pensarem em tomar uma atitude, mas Black Mirror está aí para nos surpreender e nesse episódio nos surpreende e muito, nos mostrando uma outra crítica ainda pior.
O último episódio da 2° temporada tem o nome de The Waldo Moment, e conta a história de um humorista fracassado que ganha a vida emprestando a voz e expressões à animação de um urso azul chamado Waldo, que é personagem de um programa de humor que serve para ridicularizar políticos e celebridades. Porém, tudo muda quando Waldo ganha um programa solo onde fica atormentando um candidato político, que fica muito incomodado com isso. Após perseguir o político pelas ruas num caminhão com uma tela na lateral e devido ao seu sucesso com o público jovem, decidem que seria ótimo se Waldo também se candidatasse, e o pior de tudo é que o povo apoia a ideia. A crítica neste episódio fica claramente ao fato das pessoas ouvirem demais o que certas personalidades pop tem a dizer e pouco se importarem com política. Ou seja, é uma cutucada no cu de quem idolatra os “formadores de opinião” e não consegue ter uma opinião própria.
Enfim, Black Mirror é muito mais do que uma série, é um soco na boca do estômago, uma bicuda no pau do nariz e uma dedada tripla no rabo da atual sociedade. E é exatamente por conseguir nos fazer refletir sobre a vida que levamos que Black Mirror é a melhor série de todos os tempos.
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