Aturando Saramago

Analfabetismo Funcional terça-feira, 04 de maio de 2010
 “Se tá achando ruim, não leia!”

Há livros cuja leitura é um chute no ovo muito enfadonha, mas ainda assim fazem sucesso. As obras de José Saramago – ao menos as que eu conheço – são um exemplo disso. Digo que são enfadonhas por esses e outros motivos:

(a) A leitura se arrasta lentamente, chegando a ser um teste da paciência do leitor;
(b) Parágrafos quilométricos que às vezes duram até um capítulo inteiro e dificultam a leitura;
(c) Além dos parágrafos enormes, não há travessões. As falas dos personagens, o pensamento dos protagonistas e os comentários do narrador são separados por vírgulas e nada mais. Até que você se acostume com esse “estilo” já se foi metade do livro;
(d) Presença de palavrinhas e termos praticamente desconhecidos, provenientes do português de Portugal, já que o ganhador do Nobel não autoriza a “adaptação” para o nosso português;
(e) Incursões psicológicas intermináveis que muitas vezes nada tem a ver com o enredo e colaboram para a leitura se arrastar ainda mais.

Aí você me pergunta. Se são tão chatos de ler why the hell o cara vende tanto e já ganhou até Prêmio Nobel de Literatura? Quanto ao Nobel, vou nem comentar… Afinal, dificilmente essas premiações são boas referências. O segredo do velhinho português são os temas instigantes, curiosos, inéditos e até bizarros. Não tem como não chamarem a atenção. Falarei só dos que eu li:

Ensaio sobre a cegueira – Esse todo mundo conhece por causa da versão cinematográfica que, por sinal, é bem fiel e não decepciona (Vide As decepcionantes adaptações para o cinema). Anyway, o livro retrata como seria se (Quase) todos habitantes de uma cidade, ou até um país, ficassem, de repente, cegos.

O homem duplicado – Conta as atitudes que teve o os conflitos psicológicos de um professor de História que está assistindo um filme e vê um ator IGUAL a ele. Imagina o tamanho do imbróglio.

As intermitências da morte – Já pensou se todos que estivessem dentro dos limites territoriais de um país, simplesmente pela vontade da Morte, não morressem mais? Então…

Isso porque não mencionei os livros com polêmicas religiosas como Caim e O Evangelho segundo Jesus Cristo (Que não li). Como a maioria dos títulos são curiosos e, de certa forma, denunciam o conteúdo da narração, cito mais alguns: A Viagem do Elefante, Ensaio Sobre a Lucidez, A Jangada de Pedra e Terra do Pecado.

Evidente que tais enredos despertam a curiosidade de muita gente. Além disso, é inegável reconhecer que Saramago tem uma brilhante mente, capaz de simular e imaginar muitas conseqüências e possibilidades diante das situações capciosas que ele mesmo inventa. Então ele inventa essas ficções mirabolantes, mas não decepciona no momento de criar uma história que de tão bem estruturada passa a parecer real e plausível.

Basicamente, Saramago instiga a curiosidade do leitor que quer a todo custo saber as conseqüências da questão criada, como se comportarão os protagonistas, a explicação de tudo e qual será o final da história. Para chegar a esse final o leitor passa por cima de todas chatices mencionadas e dá um desconto pro velhinho porque, no final das contas, as histórias são muito boas e interessantes. Eis o trunfo do tal José Saramago.

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