Quadrinhos para quem não quer quadrinhos
Não lembro se já falei aqui antes, mas eu não sou de ler quadrinhos. Quero dizer, não tenho nada contra o formato e tenho uma pequena coleção d’O Fantasma, além de uns exemplares “sortidos”, como X-Men 2099, Força-Tarefa Liga da Justiça e O Homem-Aranha, e claro, alguns gibis da Turma da Mônica, mas de forma geral, simplesmente não é algo que me chama atenção… E eu sei de quem é a culpa.
E ela é toda minha. E de vocês também. Lembram quando nós eramos pivetes preguiçosos e desocupados, podíamos brincar alegremente durante a manhã toda, para na hora do almoço, correr e sentar no sofá para ver desenho na TV aberta? Então, estávamos lá sentados, acompanhando nossos desenhos favoritos (Sim, meus jovens, naquela época ainda respeitavam um pouco a “cronologia” das coisas), quando percebíamos que o Panthro estava com uma voz diferente, que aquela não era a risada do Esqueleto e que o Tio Patinhas falava do mesmo jeito que o Capitão Boeing? Pois é, isso mudou, hoje há um certo “respeito” com o telespectador, ou seja, a dublagem, mesmo ainda não estando em nível internacional, mudou muito, se profissionalizou, por assim dizer, e é claro que tudo tem um custo: Pagar imposto, preços mais altos, menor incidência de pérolas imperdíveis e dubladores sem respeito por seus fãs (PORRA WENDELL, EDWARD CULLEN, VÉI?!).
Essas mudanças aconteceram por dois motivos básicos: O mercado internacional “pedia” isso e os consumidores já estavam de saco cheio da dublagem porca (Coincidentemente a tal da “TV à cabo” começou a crescer naquela época), e o mesmo está acontecendo com os quadrinhos ultimamente: O mercado está crescendo muito (Tanto que há muito brasileiro trabalhando para editoras gringas) e ninguém mais aguenta ler as mesmas histórias da Turma da Mônica (E Turma da Mônica Jovem é uma merda – e uma heresia – gigantesca).
O mercado brasileiro já foi grande, mas nunca como é hoje: Alguns dos melhores desenhistas de HQs da atualidade são brasileiros, a quantidade de quadrinhos (De “títulos”, não exemplares) nunca foi tão grande, há centenas de cursos de desenho direcionados para os quadrinhos, há adaptações de clássicos da literatura para o formato e existem centenas de quadrinhos autorais, feitos por brasileiros, para o Brasil, com ótima qualidade (Tanto de arte quanto de roteiro), sendo publicados diariamente… na internet.
Todos sabemos que brasileiro não gosta de ler porque pensar é difícil, que não compra livros (E jornais, mangás, revistas, cartilhas, folhetos, diários, gibis, tablóides, etc.) e não se interessa por nada escrito que não tenha ao menos uma foto (E seja receita de algum bolo), mas é realmente impressionante a quantidade de trabalhos (Mais especificamente, quadrinhos e tirinhas – que, sejamos sinceros, são praticamente primos) “nacionais” que tem na internet. De cara cito o Um Sábado Qualquer, Terapia, O Homem-Grilo, Notas Sobre o Fim, Puny Parker, o Quarto Mundo (Que reúne diversos projetos), Necronauta, O Diário de Virgínia, De(ath)sign, Malvados e Tune 8, e olhem que eu não conheço nem um terço de tudo que se faz aqui no Brasil, que dirá no mundo.
A questão é que praticamente não se publica (No papel, com tinta) mais nada no Brasil. Sim, eu sei que é um mercado difícil, principalmente para os quadrinhos, que mesmo em alta não se comparam à venda da Veja, do Estadão ou do Paulo Coelho, mas a impressão que passa é que apenas uma pequena parte QUER ser publicada, quer poder PEGAR no próprio trabalho e dizer – com orgulho – que ele (Ou ela) que fez aquilo alí. A impressão que passa é que nego se preocupa mais com a quantidade de exemplares vendidos do que com o fato de que o trabalho é reconhecido, ele pode até ser uma merda, mas é reconhecido. Claro que tem pessoas que fazem de tudo para ter seu trabalho publicado (Algo que, diga-se de passagem, vejo acontecer mais com os mangás do que com as HQs), correm atrás de gráfica, editora, publicidade e (Obviamente) leitores, mas há muito tempo não vejo um quadrinista (Olha que bonito fica…) dizer que deixará de ver Walking Dead na TV paga para poder ir num evento como o FIQ ou a Rio Comicon tentar vender (Por um preço absurdamente baixo) o próprio trabalho.
E é! É nossa culpa, dos consumidores (Ou deveria dizer “supostos consumidores”?), que o mercado tenha demorado tanto para chegar à um nível bom de qualidade, é nossa culpa que esse tipo de mídia não seja valorizado, é nossa culpa que haja pouco (Ou nenhum) apoio à pessoa que queira se dedicar à essas coisas (E aqui incluo tanto quadrinistas quanto coloristas e ilustradores) e é nossa culpa que quadrinho no Brasil não vende. Preferimos (Graças ao bom e velho jeito brasileiro de ser) baixar uma scan em baixa qualidade à pagar, sei lá, dez reais num quadrinho bem feito. Não estou dizendo que a culpa é toda da pirataria e das scans (Afinal, não posso tirar esse mérito dos roteristas e da Panini das editoras), muito pelo contrário, acho sim que os quadrinhos devem ser disponibilizados para download (E cobrar por isso – aproveitem, não é sempre que eu defendo o capitalismo desse jeito), mas também não se faz praticamente NADA para tornar a mídia impressa algo mais interessante: É realmente difícil fazer um pôster especial, botar uma capa dura e usar um papel de qualidade? Claro que isso aumenta o preço, mas se bem feito, creio que quem gosta de quadrinhos (E pessoas em cima do muro, feito eu), não se incomodariam em pagar 5 reais a mais.
Enquanto o pensamento do consumidor (E nem me refiro à toda a população do país, mas a que gosta da coisa) não mudar, veremos mais e mais projetos legais na internet, sendo desperdiçados di gratis, ao invés de estarem em bancas, revistarias e livrarias, ajudando a formar a infância dessas novas gerações (E disso ninguém pode reclamar do Maurício de Souza). Sei que alguns dos exemplos que dei já foram publicados, mas você já viu alguém com um exemplar na mão, deixando de ouvir um podcast tosco ou ler O Segredo, para ler um quadrinho? Pois é, enquanto não estivermos dispostos a ter um gibi publicado, não merecemos um gibi publicado, mas sempre poderemos contar com o Guilherme Briggs.
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