20 anos de Pearl Jam

Música segunda-feira, 14 de novembro de 2011

O Pearl Jam é uma banda curiosa. Teve uma trajetória inusitadamente tranquila pra uma banda que saiu de Seattle no início dos anos 90 e vem tentando desesperadamente não fazer sucesso desde o lançamento do Ten, com discos cada vez mais intimistas e diferentes entre si. Ao mesmo tempo, é uma das poucas bandas remanescentes do último grande movimento do rock e conseguiu pegar o melhor que o grunge tinha a oferecer pra criar um estilo único, que continua evoluindo em 20 anos de carreira. E faz anos e anos que eu ouço e nunca lembro de mencionar quando me perguntam as minhas bandas favoritas. Coisa que provavelmente não se repetirá depois dessa última passagem dos caras pelo Brasil. Sim, depois de passar os últimos anos lamentando por ter perdido o show de 2005, no fatídico dia 11/11/11, eu finalmente pude comprovar de uma vez por todas. O Pearl Jam é, indiscutivelmente, a maior banda em atividade do mundo.

Tudo começou como um típico show internacional: Algumas horas na fila seguidas de mais algumas horas em pé pra assegurar o valiosíssimo lugar perto do palco que algumas horas na fila garantiram. Mas esses detalhes não importam. Todo mundo sabia que no primeiro acorde tudo valeria a pena. Ou até antes, no caso de Porto Alegre, graças a excelente mistura de punk californiano e rockabilly apresentada pela banda de abertura X, com direito a participação especial do próprio Eddie Vedder na última música. Aliás, Eddie Vedder, que cara sensacional. Seja compondo a trilha sonora do filme Na Natureza Selvagem ou gravando um CD apenas com um ukulele.

Mas foi no momento que ele entrou em cena com o Pearl Jam que o público percebeu que aquela não seria uma noite qualquer. Desde o começo explosivo com Why Go, seguida por Do The Evolution, uma aura mística começou a se formar em torno do estádio lotado por 22 mil pessoas. E eu preciso repetir: Eddie Vedder, que ser humano extraordinário. Eu não consigo imaginar frontman algum que possa pedir de forma tão apropriada pra que todo mundo dê dois passos pra trás, por causa dos muitos jovens e mulheres encostados na grade. A partir daí, a ligação da plateia com a banda foi algo de sobrenatural. Parecia que ninguém realmente acreditava no que estava acontecendo. O coro coletivo durante Black, talvez o maior clássico da banda, foi um deses momentos que ficam suspensos no ar. O show poderia ter acabado por aí.

Mas claro que isso não ia acontecer. Momentos depois, a banda volta pro palco. Eddie, lendo desajeitadamente algumas frases em português, diz que é o aniversário de sua esposa Jill, e gostaria que o público desejasse um feliz aniversário pra ela. A plateia, surpreendentemente, começa com um Happy birthday to you, quando o vocalista carinhosamente os corrige, puxando um Parabéns pra Você. Foi um momento que soaria forçado vindo de qualquer outra pessoa, mas Eddie Vedder conferiu uma sinceridade tão grande à coisa toda, que foi impossível não se emocionar. Como se não bastasse, instantes depois ele lembra que esteve no Brasil pela primeira vez com os Ramones, e dedica Light Years pro Joey Ramone, seguida do cover de I Believe In Miracles.

Logo depois veio The Fixer, sintetizando exatamente o que a banda representava naquele momento. Pelo menos por um instante, o Pearl Jam foi o próprio consertador. Quando a banda tocava Quando algo estiver escuro, deixe-me colocar um pouco mais de luz, era exatamente o que ela gostaria de fazer. Literalmente, inclusive. Em uma parte do show, quando um refletor incidia diretamente sob Eddie, ele usou algo de metal (Desculpem a minha miopia) pra redirecionar a luz pra plateia. O iluminado Eddie Vedder, tentando consertar algo quebrado, lutando para trazer de volta algo que há muito se perdeu.

Mas traduções livres a parte, eis que a banda sai do palco de novo, apenas pro Eddie voltar numa corridinha marota de novo, como que dizendo Há, pegadinha do malandro! Nesse ponto, a banda nem precisou se esforçar pra conduzir a plateia pelos versos de Better Man. Até que finalmente, soaram as primeiras notas de Jeremy, música pedida desde o começo do show. Era a plenitude. A coisa não tinha como continuar depois disso. Mas o Pearl Jam deu um jeito, emendando Alive imediatamente, pra depois de mais algumas músicas, aí sim, encerrar com Yellow Ledbetter. Mais apropriado impossível.

Eu ia ainda escrever sobre as vantagens dessa variação de setlist que a banda faz entre uma apresentação e outra, apesar de alguns hits ficarem de fora por causa disso. Mas pensando bem, NADA ficou de fora nas quase 3 horas de show. O Pearl Jam conseguiu a façanha de nos brindar com um pouco de cada fase da banda. Com certeza, o show teve um momento alto diferente pra cada fã. Porra, quem poderia imaginar que alguma vez na vida ouvíssemos Rats, Present Tense, ou até Oceans, ao vivo!? Sem contar nas versões estendidas de quase todas as 32 músicas, as palmas do público marcando o ritmo durante os solos do Mike McCready e a vibração do Eddie Vedder ao conseguir pronunciar a palavra incríveis corretamente.

Os 20 anos de Pearl Jam representam perfeitamente uma devoção à música que as vezes esquecemos que ainda existe, vinda de uma banda que transborda honestidade, energia e se tornou muito maior que qualquer rótulo. E se uma coisa é certa nesses absurdos tempos pós-modernos em que vivemos, tempos de revoluções via twitter e protestos de motivação duvidosa em universidades, é que o Pearl Jam continuará no auge por mais 10, 20, 30 anos, ou por quanto tempo durar. E caso isso não aconteça, como a própria banda nos lembra, It’s ok.

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