Sobre o Madureira Esporte Clube e por que o Demolidor é melhor que o Homem-Aranha
De vez em quando você gosta tanto de alguma coisa, que não adianta o que os outros falem, você continua achando que aquilo que você gosta é melhor? Pode ser um time, um personagem, um filme, uma série, enfim, qualquer coisa dessas que despertam defensores e detratores. É como ser torcedor fanático do Madureira: Você desenvolve a superior capacidade de defender o indefensável, de gostar daquilo que é menos querido. Você prefere ficar do lado daquilo que os apostadores chamam de underdog, aquele de quem já se espera a derrota, por qualquer motivo. Só que se você é assim, faz parte da ínfima minoria. Sabe o que aconteceria se o Madureira passasse a ganhar todas? Vamos ver.
Ah, e eu não torço pro Madureira, deus me livre. Vem comigo.
Nos esportes e apostas, o lado do qual se espera a vitória é chamado de top dog, o favorito. Quando a ordem das expectativas é subvertida e o underdog ganha, isso é chamado de um upset – literalmente, adjetivo em inglês que corresponde a “chateado”, alguém meio triste. Que é como você vai ficar, a não ser é claro, que você tenha apostado no menos favorito, onde você será o (Provavelmente único) feliz ganhador de uma underdog bet, que paga muito mais justamente pelas parcas chances do apostador ganhar.
“Mas Kirk, e daí?”, você deve estar pensando. Bom, daí que eu acho que o Demolidor é melhor que o Homem-Aranha. O aracnídeo é mais popular e conhecido por qualquer um que não tenha nascido em uma caverna e sido criado por lobos, tem quatro filmes nas costas (Só dois bons, um mais ou menos e um que é uma bosta) e no geral é um personagem aclamado. O Demolidor é menos popular, tem um filme meia-boca e é capaz que muita gente não familiarizada com quadrinhos o ignore totalmente. Mesmo assim, eu prefiro o advogado cegueta.
Curiosamente, a reputação dos dois heróis nos quadrinhos é completamente diferente do descrito acima. Matt Murdock é um advogado de sucesso, rico e tranzudo, sempre atraindo lindas mulheres e ganhando casos difíceis. Nas noites é o Demolidor, herói que ganhou o apelido de Homem Sem Medo por suas proezas salvando Nova Iorque dos criminosos com acrobacias, golpes e quatro sentidos super apurados – eles ficaram assim depois de um acidente com radiação, que também o deixou cego. Já Peter Parker (A.K.A. Pedro Prado), é um loser, apesar de ser muito inteligente. Passa a vida correndo atrás de mulheres que não o querem, mora com a tia e quase sempre está na pindaíba, o que é óbvio, já que não dá pra viver numa das cidades mais caras do mundo com a miséria que ganha como fotógrafo freelancer. Nas noites, sai pra salvar Nova Iorque dos criminosos e nunca recebe a devida recompensa por isso, sendo perseguido e taxado de criminoso pelo próprio jornal onde trabalha.
Mas é justamente o fato do Homem-Aranha ser um perdedor nos quadrinhos que o transformou em um favorito no mundo real. Afinal, a cultura pop nos fez amar os perdedores. Talvez seja a nossa esperança de triunfar sobre as dificuldades que faça isso, mas o fato é que torcer pelo underdog nunca foi tão popular. Nada é melhor que uma boa história de superação. Vejam só Forrest Gump. Vejam Apollo 13 (Que é melhor ainda por que aconteceu de verdade). Vejam qualquer filme de ação dos anos 80. Os filmes, séries, quadrinhos e tudo o mais transformaram o perdedor em favorito. O loser do Peter Parker é um favorito justamente por ser loser. Matt Murdock podia ser amado assim se não tivesse sucesso na carreira, se contasse as transas por semestre e não tivesse um apelido legal. Nós gostamos de torcer para que o injustiçado se dê bem, que o mocinho da novela das oito consiga conquistar a menina bonita. Mas e o virtuoso fodão, e o sujeito bom e de sucesso? Esse não importa. Não que os vencedores não tenham problemas de vez em quando, mas quanto mais lascado melhor para o público – maior é o desafio. Se Peter Parker ganha um emprego melhor e fica popular, a coisa desanda. The Amazing Spider-Man tá aí pra provar isso.
Mas Matt Murdock é um perdedor por que é um vencedor. Ele é menos popular no mundo real por que, nos quadrinhos, ele é melhor. Já Peter Parker é favorito por que nos quadrinhos ele é uma besta e temos pena dele, torcemos por ele. Mas o pulo do gato, ou da aranha, sei lá, é que se esses dois existissem de verdade, tudo seria como nos quadrinhos. Sabe o que isso tudo quer dizer? Que se fizessem um filme onde o Madureira vencesse o Barcelona e fosse campeão do mundo, provavelmente seria o sucesso cinematográfico da década. Na vida real, o Tricolor Suburbano (Média de público de 284 esse ano) manda um forte abraço da Série C. Gostamos de um perdedor, mas geralmente só de mentirinha. E os quadrinhos faturam exatamente em cima disso – assim como todo o resto da cultura pop.
Vida longa e próspera.
Além de misturar crônica esportiva com quadrinhos, eu também escrevo coisas (Mais ou menos) sérias, como crônicas e contos. Visite o Estranho Sem Nome e veja. Mas vê se não esquece do Bacon, mandrião.
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