É pedir demais um pouco de silêncio?

Música quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Se, por uma fatalidade do destino (Ou falta de vergonha na cara), você é leitor do Bacon há anos, provavelmente já sabe que eu gosto de música porcaria. Não que eu não goste de música boa, mas eu não me envergonho do que gostava quando era mais novo, abraço o que tantos renegam e até mesmo já me expliquei sobre algumas delas, mas hoje… Hoje vai ser pior.

 decepçãos.

Cara, eu ouço música ruim.

Eu ouço Lady Gaga. E Pink. E Sia. Nelly Furtado, Britney Spears, Bruno Mars, Adele, Nicki Minaj, Imagine Dragons, James Blunt, Kings of Leon, Katy Perry, Smash Mouth, Jessie J, Rihanna, Nirvana, Owl City, Pussycat Dolls, Beyoncé, Jennifer Lopes, Bon Jovi, Avril Lavigne e Green Day.

Eu juro que eu não fazia isso uns anos atrás. Eu tô preocupado. Eu sempre ouvi porcaria e gostei, mas cara, tinha um motivo. Ou a letra era maneira, ou o clipe, ou era aquela música que é de preto, de favelado quando toca no churrasco é foda pra caralho: Elas tinham alguma qualidade redentora, saca? Eu tinha um motivo, eu tinha uma desculpa… Mas isso acabou.

Dizem que o primeiro passo pra se curar é aceitar que você tem um problema e puta que me pariu, eu tenho um baita dum problema: Eu só ouço lixo. Há anos eu só ouço lixo. Tem uma ou outra coisa boa perdida, e não que eu tenha parado de ouvir as coisas boas (E as ruins) que eu sempre gostei, mas tem muito, muito tempo já que “ouvir música” pra mim significa abrir o YouTube e ouvir porcarias. E é ainda pior: Se você for minimamente ligeiro já notou que na lista alí em cima não tem nada atual: Eu ouço música ruim E VELHA.

Como bom hipster babaca que sou eu não posso seguir o mainstream, mas deixando isso de lado, eu nunca fui antenado (E se o uso dessa gíria não te convence, nada convencerá), eu nunca soube o que tava rolando enquanto estava rolando. Não que eu não tenha estado a par de Justin Bieber, Gaga e tantos e tantos outros, mas eu nunca liguei: Eu não sabia os nomes das músicas, não sabia letras, sequer reconhecia quem era que tava cantando quando tocava na rádio porque eu cagava pra isso tudo… Eu ia descobrir as coisas anos depois. Eu ainda faço isso na verdade: Fui ouvir, pela primeira vez, Super Bass da Nicki Minaj TRÊS ANOS após o lançamento da música…

Eu sei o nome, eu conheço o clipe, reconheço quando toca em qualquer lugar, sei até a coreografia. EU NÃO DANÇO, mas sei.

Eu faço isso direto: Pego algo que, uns anos atrás, eu não liguei a mínima, ou pior, declarei enfaticamente o quanto não gostei e queria que nunca tivesse existido, e aí passo horas e horas e horas ouvindo, repetidas vezes, dia após dia, HÁ ANOS.

Poderia-se dizer que é um reflexo da idade, afinal eu não sou nenhum pirralho mais, tô velho, meu pinto não sobe, e aquele ímpeto adolescente de xingar o mundo inteiro por estar fazendo tudo errado desapareceu, mas não é como se essas coisas sejam boas: Elas são ruins. Eu sei que são ruins, sei que não era tão totalmente tapado quando era mais jovem e que tinha, até certo ponto, uma noção do que eu fazia. Eu jamais iria num show da Katy Perry, jamais compraria um CD do Bruno Mars e jamais aplaudiria a Beyoncé, e nada disso mudou, mas puta merda, eu OUÇO toda essa gente.

E isso é, de longe, o pior de tudo porque, afinal de contas, essa gente faz música. Pode ser ruim, pode ser brega, pode ser tão enfurecedor que te faz desejar ser surdo, mas não deixa de ser música: Feita pra ser ouvida. Não dar dinheiro pra galera é um copo d’água no deserto que virou minha playlist, mas ainda assim não é uma equipe de resgate.

Já falei em algum texto que não achei, que não sou uma pessoa de artistas ou álbuns: Não me ligo em discografias, coletâneas e períodos artísticos, mas em cada música individualmente, e isso não mudou. De todos aqueles nomes que citei alí em cima (E vários outros) há sim músicas que eu gosto e ouço sem problema: Tenho certeza que isso é extremamente reprovável da minha parte, mas eu gosto. O problema é que não é ouvir duas músicas de um, três de outro e meia dúzia da Britney (Porque a Britney é uma trambicagem da porra, mas faz isso com propriedade e eu gosto de competência), o problema é que eu abro uma música qualquer, e aí passo pra outra música qualquer, e outra, e outra e continuo assim de um artista pior pro outro, e quando eu me dou conta já rodei três vezes as mesmas músicas e nenhuma delas presta.

Não é obsessão, não é falta de escolha, recurso ou tempo: Eu poderia muito bem botar qualquer coisa boa pra tocar, e tão rápido coloco uma que é ruim. Eu sei que este é outro daqueles meus problemas que só são culpa minha, mas o que me preocupa não é ouvir lixo, é o motivo disso: Barulho de fundo.

Eu não ouço Rihanna porque eu quero ouvir Rihanna, do mesmo jeito que nem mesmo ouço Elton John pra ouvir Elton John: Eu só não quero silêncio. Seja com ou sem fone, enquanto escrevo um texto (Este aqui está sendo escrito com o som do ventilador do meu lado apenas) ou enquanto mato tempo útil vasculhando a internet, o importante é não ter silêncio. E pra mim isso sim é uma coisa grave. Porque eu passei a gigantesca maioria da minha vida desejando ardentemente que as pessoas calassem a boca só um alguns segundos. Não é rebeldia juvenil, é poluição sonora: Barulho sem motivo e propósito, só porque é possível fazê-lo.

People talking without speaking
People hearing without listening

Silêncio é uma das coisas que eu mais valorizo na minha vida, faz parte da minha personalidade, eu preciso de um mínimo de silêncio para organizar meus pensamentos, ter ideias, responder ao mundo ao meu redor.

Mas, nos últimos anos, eu tenho jogado isso de lado quando estou no computador. E eu não sei porque tal especificidade, mas o fato é que se eu abrir o YouTube agora mesmo as indicações para mim são Bruno Mars, R.E.M., James Blunt, Red Hot Chilli Peppers, Wham!, Kings of Leon, Elton John, Dido, Jason Mraz, Queen, Keane, Counting Crows, Gwen Stefani, Sia, Pete Yorn, Adele, Boston e Journey. Tem coisa boa nesse meio, mas eu não ligo. Do mesmo jeito que não ligo de ter as coisas ruins.

Talvez, em termos práticos, seja simplesmente uma questão de facilidade: Tem mais coisa ruim que boa, sites e buscas são otimizados de acordo com popularidade atual e pode muito bem ser manipulados, e depois de um tempo suas “preferências” são salvas, facilitando assim que você as acesse (E às seus semelhantes). Mas isso tudo, até certo ponto, funcionaria para qualquer coisa que você estivesse disposto a buscar, então talvez seja uma questão de sinais iguais: Já que é pra não ligar pro que está acontecendo, que seja com a ajuda de coisas para as quais você não liga.

Não é catarse, é só uma racionalização débil. No fim do dia ainda significa que eu gasto tempo e energia ouvindo (Mesmo sem prestar atenção) coisas que eu não gosto, que eu não acho que mereçam atenção (Minha e nem de ninguém) e que eu continuo (De forma simples, porém ainda efetiva) apoiando. Uma visualização não faz grandes merdas, mas é um jogo de número e ele nunca abaixa. Eu tô jogando fora um dos alicerces da minha vida e nem mesmo é por algo que valha à pena.

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