A leitura digital e a morte do papel
Já tem coisa de uma semana que eu tenho me questionado bastante acerca dos meus hábitos de leitura, mais especificamente em como, quando e onde eu leio. Os temas e preferências continuam os mesmos de sempre, variando desde artigos científicos e descobertas recentes até memes e literatura infantojuvenil (Fazia tempo que cê não escutava essa expressão, não é?), mas de uns anos pra cá a logística da minha leitura mudou muito… Em outras palavras, eu leio muitos poucos livros.
Passei bons quatro anos lendo diariamente, várias horas por dia, mesmo que boa parte do que eu li não tenha sido grandemente proveitoso nem na minha vida nem pra textos aqui pro Bacon. Ainda assim, por esses anos li praticamente tudo que queria, numa tentativa meio idiota, inocente e desregrada de ter vocabulário… Deu certo, ao menos parcialmente. A outra consequência disso é que eu cansei de ler… Chega um momento pra qualquer coisa na vida que cê tem a fatídica estafa. Admito aqui que eu achava que este último texto tinha sido há menos tempo: 2014, cara! Mas ainda assim é (Parcialmente) válido.
Claro que nesse meio tempo bastante coisa mudou; com o tempo, a vontade de ler foi voltando aos poucos… O meu erro porém, foi, à época, achar que seria do mesmo jeito que antes. Lembra do Lulu Santos? Então. Com o tempo fui percebendo que o meu interesse pela leitura mudou, amadureceu, e hoje é mais um capítulo nessa história.
Tem coisa de uns 10 dias que venho pensando seriamente em comprar um ebook reader. Quem te viu, quem te vê. Reneguei pra caralho essa parada, de início (E até muito pouco tempo atrás) só de frescura e babaquice mesmo, hoje só não tenho um pois, após pesquisar melhor, me dei conta de que não serve pra como eu leio atualmente:
– Leio muito mais pela internet do que qualquer livro.
– Leio mais matérias e artigos que contos e crônicas.
– Grande parte do que eu leio sai diretamente de links em redes sociais ou sites que eu já acompanho.
– Muito material de leitura dos dias atuais têm várias e várias fotos e vídeos de acompanhamento.
Os ebook readers (Aliás, já tem nome em português pra isso?), com suas telas em preto e branco, pequenas, a maioria com conexão com a internet limitada (Ou inexistente), sem possibilidade de tocar áudio e vídeo, sem a possibilidade de adicionar notas e escrever textos – Enfim, um ebook reader não funciona pra como eu leio. E isso é estranho porque em tempos de gadgets e um mundo digital, eles são sim a melhor chance dos livros. Vocês não me veriam falando isso até um tempo atrás, então vou repetir: Se você se interessa pela leitura, um ebook reader é uma boa opção que te dá muitas facilidades que a mídia tradicional não permite e, de quebra, te mantém atualizado com o padrão de vida da nossa sociedade.
A questão, porém, é que eu não preciso de ebook readers porque eu não leio mais livros. Eu não preciso de um aparelho que substitua o papel impresso, eu preciso de um aparelho que me distancie dele, que me permita acessar o material que eu quero ler em qualquer lugar, de qualquer fonte, e me deixe imediatamente pesquisar mais sobre o tópico, assistir uma entrevista do autor, participar de um debate sobre o tema (Pra não falar na leitura de quadrinhos!): Hoje, a minha leitura é muito mais interativa do que jamais foi, e isso nenhum livro e nenhum ebook reader pode me dar porque são ambos arcaicos em sua abordagem da atividade “leitura”. Leitura, pra ambos, é uma atividade unilateral.
Ao mesmo tempo que isso significa sim um abandono de fontes (Teoricamente) mais confiáveis, também significa que ler ficou mais fácil, mas acessível e, consequentemente, mais prazeroso. Claro que não precisar carregar meio quilo de papel por aí é uma vantagem, mas na boa? Foda-se. Eu gosto da parada, carregar o livro por aí é o de menos, o que não rola mais pra mim é terminar um livro e não poder me aprofundar num assunto debatido porque eu não tô perto de uma livraria. É não ter como tirar uma dúvida de gramática porque eu precisaria carregar também um outro livro e um dicionário junto.
Eu sei perfeitamente bem que os celulares atuais dão mais do que conta desse serviço auxiliar à leitura, afinal cê tem quantos dicionários e páginas da Wikipedia você quiser no teu bolso. Mas, particularmente, ler no celular, pra mim, é uma bosta. Talvez a tela do meu seja pequena demais, talvez seja ter que lidar com a distração de todas as outras possibilidades literalmente ao alcance do seu dedo, mas o ponto principal é que a leitura ainda é o ponto principal. O jeito que eu leio atualmente requer a interação com todo o mundo digital, mas ao mesmo tempo requer a privacidade de ser o único ponto focal para a minha atenção. No meu mundo ideal os ebook readers seriam tablets que não tentam se passar por computadores.
Independente dos meus problemas logísticos, é válido notar o quanto a leitura em si mudou. Como eu disse, o isolamento de um livro, hoje, tem que advir de sua história, de sua narrativa, dos personagens, da imersão que as palavras na página permitem, não da mídia. Não do fato de que ler é sim uma atividade individual e solitária por natureza. Eu ainda não quero ser interrompido enquanto leio ou ser forçado a ser “social” quando eu não quero, mas eu quero sim que a minha leitura traga mais frutos do que apenas o conhecimento e o vocabulário que, sejamos sinceros aqui, viriam de qualquer jeito pelo simples exercício de ler. Ler, hoje, pra mim, é sim individual mas comunitário. E isso livro impresso nenhum vai poder me dar (Aliás, é bom que não dê – “cada macaco no seu galho” não é uma desvantagem, muito pelo contrário): É indiferente se a tecnologia atual me dá isso da melhor forma possível, o fato é que a minha evolução como leitor caminhou em favor da mídia digital, não por ser digital, mas por ser globalizada, universal, conectada.
Talvez seja óbvio pra tanta gente, mas só me dei conta recentemente: Ler não é sobre conforto, e talvez devesse ser. Não em temática, mas em interface e uso mesmo: Tanto esforço e pesquisa em tornar a TV menos cansativa de assistir, em melhor qualidade de imagem, em controle remoto em tudo que é aparelho… Aliás, todas as outras mídias se preocupam em como o usuário aborda o uso (HA!) da mídia, pesquisando jeitos de tornar a tarefa mais rápida, simples, intuitiva (Percebem o vocabulário da questão?), enquanto que ler um livro e exatamente a mesma coisa há centenas de anos. Tudo bem que o papel moderno é uma baita evolução em relação à uma pedra de granito de meia tonelada, mas porra, haja atraso no update da parada. O ato de ler deveria ser mais fácil, estar na nossa mão, fazer parte da nossa rotina (Que já envolve tanta coisa supérflua e secundária)… Deveria fazer parte da vida moderna, e não ser só um opcional.
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