Algumas coisas que deram certo na trilogia de Christopher Nolan para o Batman
Semana passada No começo do mês eu detonei com o filme do Christopher Nolan, Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge, frisei cada problema com o roteiro e a execução do filme, tal qual um catador de piolhos. Pode não parecer, mas eu gostei do filme. Infelizmente eu gostei ainda mais dos outros dois filmes anteriores. E por isso mesmo resolvi enumerar algumas coisas que deram certo na trilogia feita pra nós pelo Nolan. Afinal, ele não conseguiu cagar tudo nos três filmes. Muito pelo contrário…
Selina Kyle
The Dark Knight Rises me deixou completamente cheio de expectativas ao longo dos quase quatro anos que o separaram da segundo filme da trilogia. Como eles iam superar aquilo tudo? Inicialmente, quando anunciaram que Anne Hathaway iria interpretar a nova Mulher-Gato, eu pela primeira vez perdi a confiança no filme. Apesar dos pesares, confesso que me equivoquei. Claro, como eu disse no meu post anterior, existem muitas incongruências no roteiro, inclusive com a personagem. Mas também houveram muitos acertos. O que era essa roupa? Ficou realmente demais! Os óculos se tornam “orelhas”? Ela nunca é chamada de “Mulher Gato” no filme, e esta foi uma escolha muito acertada, colocando todo o foco no temperamento brincalhão e frágil, além da personalidade forte da personagem. Isso é o que se esperaria de Selina Kyle. Nolan fez com o personagem muito mais do que Tim Burton fez, sem desmerecer tudo o que Michelle Pfeiffer foi.
Harvey Dent
O cavaleiro branco do segundo filme da trilogia foi muito bem interpretado por Aaron Eckhart, mas foi a execução do personagem no roteiro o tornou realmente marcante. Não importa o jeito que o Nolan escolheu para representar o Duas-Caras no filme. O que realmente interessa aqui é o lado bom que Eckhart interpretou com a paixão perfeita para fazer justiça ao papel de advogado de Gotham. Foi crucial para o filme vermos Harvey em sua plenitude, como o herói que o povo de Gotham admirava. Ele não era descartável como o Harvey interpretado por Billy Dee Williams em Batman Returns. Nem era uma versão do Coringa de Nicholson como a versão de Tommy Lee Jones em Batman Forever. Nem mesmo quando se torna finalmente o infame Duas-Caras. Mas essa comparação é uma covardia.
Gotham City
Visualmente falando, Gotham City foi uma parte bastante nebulosa em toda a série, e isso foi quase um problema. Mas tudo bem, a inconsistência da cidade, sempre mostrada ao longe, deslocando a cidade da lenda de Gotham, sempre mostrada como uma cidade gigantesca, gótica e irreal. É essa ideia em particular que me fez colocar a Gotham de Nolan nessa lista. Gotham se tornou um personagem, amada por Batman/Bruce Wayne, complexa, perigosa, ingrata, corrupta. Esse foi um elemento crucial do mito e uma grande ausência em cada encarnação da cidade mostrada nos filmes anteriores. Nolan e companhia entenderam a importância da personalidade que a cidade deveria ter, da sua similaridade com Nova Iorque. Diferentemente de Metrópolis, que não tem sua identidade fortemente ligada a de nenhuma cidade americana. Pela primeira vez, Gotham se tornou um lugar crível, provavelmente a coisa mais realista nessa visão quase sem exageros que o Nolan trouxe ao personagem.
O Batmóvel
Por um lado, eu realmente não gostei do design do Tumbler e eu nunca tentei gostar. Mas por outro lado, sempre foi estranho pra mim considerar quando via nos filmes anteriores que poderia realmente existir alguma coisa tão brega quanto os batmóveis desenvolvidos pra eles. Definitivamente, o Tumbler não foi o carro mais elegante, nem o mais bem desenhado e concebido pro Batman. E justamente por isso ele deu certo. O Tumbler consegue se amarrar organicamente ao mundo do filme, pois não foi feito pra combater o crime. Mas indiretamente, foi construído pelas Industrias Wayne. Eu sempre imaginava que o Batman/Bruce Wayne deveria ser um grande gênio, equiparando-se a Tony Stark, por ter construído coisas tão fantásticas quanto a Bat-Caverna e o Batmóvel, completamente sozinho. A ideia de usar as Indústrias Wayne para preencher engenhocas que o Batman precisa pra conseguir combater o crime foi completamente brilhante (As cenas com Lucius Fox apresentando a Wayne as novidades foram impagáveis). Particularmente, os laços com protótipos militares deu a tudo isso um brilho que trabalhou a seu favor, tornando tudo ainda mais crível. Coisas como o Batpod (A motoca do Batman) e o Morcego (O planador/helicóptero/jato/seja lá que porra era aquilo) puseram tudo isso a perder, pois eram coisas um pouco fora do alcance, mas o Batmóvel foi um toque fresco e inovador aos filmes.
O relacionamento entre Alfred Pennyworth e Bruce Wayne
Ver Michael Caine como Alfred Pennyworth, o mordomo de Bruce Wayne e zelador da Bat-Caverna, tornou o personagem o que ele sempre deveria ser, muito mais que o reles coadjuvante de sempre. A relação dos dois foi finalmente trabalhada como devia. Caine fez um trabalho maravilhoso ao longo dos três filmes, mostrando realmente quem era Alfred, muito mais que um mordomo, um serviçal complacente com as loucuras de um magnata. Um pai e uma mãe pra Bruce, um amigo e um irmão. Infelizmente, tivemos de ver tudo isso falhar grotescamente no novo filme. Ver Caine saindo de um lábio superior duro pra um beicinho choramingando emoções cruas fez o personagem ser quase todo desconstruído.
James Gordon
Como uma série de coisas, James Gordon foi uma oportunidade desperdiçada em The Dark Knight Rises. Mas a força do personagem ainda foi suficiente pra produzir o único momento realmente emocionante para mim na parte final da trilogia, quando Batman revela sua identidade para o homem que uma vez colocou um casaco em seus ombros pra que ele soubesse que o mundo não tinha terminado. Isso não teria sido tão poderoso se o personagem não tivesse sido tão bem construído e interpretado por um dos melhores atores de todos os tempos, Gary Oldman. Começando com um policial honesto porém perdido na corrupção das ruas de Gotham em Batman Begins. E depois, no meio da ação em The Dark Knight. Tudo culminou no respeitável comissário de The Dark knight Rises. A cena com essa revelação foi a mais definitiva da série. Sem falar que finalmente Gordon também deixou pra trás o passado de personagem coadjuvante e se tornou um dos protagonistas do combate ao crime, juntamente com Batman.
A Origem
Não, não estou falando daquele outro filme do Nolan. Esta foi a única coisa que ninguém tinha tentado ainda, e foi com a volta ao cinema do morcego que encontraram a maneira mais óbvia pra ressuscitar a franquia. A visão de David Goyer foi simplesmente fascinante, uma reflexão do mito do Batman que nunca tinha sido mostrada. Estruturalmente cativante, a narrativa de como Batman se tornou realmente alguém fora de série, muito mais que um simples milionário brincando de combater o crime na cidade mais corrupta do mundo. A primeira meia hora de Batman Begins é um dos melhores trabalhos da trilogia, aonde vemos o assassinato dos Wayne, Bruce fugindo da cidade para descobrir seu propósito, caindo nas garras de Ra’s Al Ghul e da Liga das Sombras e eventualmente, voltando a Gotham para tomar seu lugar como protetor. É antes de vê-lo vestido com o lendário traje de morcego que a narrativa nos cativa e nos conquista, mostrando que tudo aquilo poderia realmente acontecer. Tudo isso foi um longo caminho para a construção de personagem, mas também estabeleceu a melhor história de origem pra um super-herói em filme que eu já vi.
O Coringa
Reza a lenda que no teste para esse papel, o melhor desempenho foi de um maluco que já chegou vestido a caráter, empunhando um prato de cannoli, de onde retirou uma arma e “fuzilou” com balas de festim o diretor e seus dois principais roteiristas, ganhando assim o papel e admiração de Christopher Nolan, seu irmão Jonathan Nolan e de David Goyer, roteiristas do filme. O Coringa foi brilhantemente e perfeitamente interpretado antes por Jack Nicholson e Mark Hamill em outras encarnações. É uma coisa engraçada sobre este Coringa. Eu não tenho certeza do que a palavra “definitivo” realmente encontre seu lugar aqui, porque eu sei que realmente nunca irá ter uma interpretação “definitiva” pra algum personagem. Mas este é um personagem icônico, tão poderoso que criou uma anomalia e uma vaga, de uma só vez, que não encontra lugar em nenhum momento na trilogia, somente enquanto o Coringa está presente na tela. Mas o que Heath Ledger fez não foi apenas fazer o personagem dele, mas redefini-lo de uma maneira surpreendentemente original. Muita gente viu semelhanças entre o Coringa de Ledger e o Alex Delarge de Malcolm Macdowel. Muita gente viu até mesmo uma imitação melhorada dos trejeitos do cantor Tom Waits. Eu só posso dizer que os céus terão que ajudar o próximo cara que tentar vestir aquele paletó roxo, usar a maquiagem e tiver a cara de pau de nos dar aquele sorriso. Esta sempre foi exclusivamente a configuração padrão da personagem, e de certa forma resume o que Nolan fez com o universo, dobrá-la à sua vontade e filtra-la através de seu próprio sentido para que estes eventos fossem mostrados em uma realidade hiper-realista. Aqui, Nolan acertou mais do que poderia, pois Ledger conseguiu o melhor Coringa de todos os tempos, mesmo indo contra todas as previsões. Ou você vai querer fingir que sempre acreditou que ele ia conseguir? Já Nolan não conseguiu, embora tenha feito os melhores filmes do Batman de todos os tempos. E ele teve apenas três chances pra isso. Acertar duas em três não é nada mal, convenhamos.
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