Amor custa mais caro
Não tinha muito que eu havia me mudado pra cidade: Mudanças na empresa que eu trabalhava acabaram levando à uma demissão em massa – uma “reestruturação” como eles chamaram – e acabei desempregado. Mandei currículo pra várias outras companhias, desde as start-ups até multinacionais, mas meus antigos colegas de trabalho ou chegaram primeiro ou tinham melhores indicações. Fiquei feliz por eles… Ao menos pela maioria. Só que isso me levou à tentar vagas bem mais distantes, e a primeira que me chamou eu fui: Quatro malas bastaram pra pôr tudo que eu tinha dentro e me mudar pra cá.
As primeiras semanas morando em repúblicas e hostels foram complicadas. Fiz de tudo pra usar só o que tinha numa das malas pra não precisar mexer nas outras. Até que, finalmente, consegui um apartamento. Um pouco mais distante do que eu gostaria, mas o bairro novo e crescendo compensava, tanto pelas facilidades que abriam todo dia quanto pelo valor mais em conta. A empresa já tinha – tem, aliás – vários anos de mercado; não é das maiores, mas já tem clientes rotineiros e tá estabelecida. O pessoal daqui faz as coisas de forma diferente do que eu estava acostumado, mas aos poucos fui pegando o jeito… A galera é bem tranquila também, o setor trabalha bem junto e o chefe não fica muito no pé.
Ainda assim, com quase dois meses morando aqui eu ainda não conhecia muita coisa da cidade. Já tinha visto os pontos turísticos e os restaurantes mais falados, mas eu não tava aqui à passeio: Era morador, e portanto tinha que começar a conhecer as coisas que nem morador conhece. É complicado sem conhecer ninguém na cidade, sendo novo e tal, e chamar colega de trabalho pode atrapalhar no fim das contas: É bom ter um tempo longe do serviço. Fui puxando conversa nos botecos, nos museus e mesmo na rua, vendo o que eu conseguia, e em uma semana já tava mais inteirado das coisas: Já sabia que posto adulterava gasolina, qual cinema tinha dia com ingresso mais barato e até onde o Feirão (A feira do rolo daqui) acontecia. Inclusive foi no Feirão que eu fiquei conhecendo o 674.
Rua dos Anjos, número 674, Centro. É estranho dar o endereço inteiro assim, todo mundo aqui conhece só com o número. Sem fazer rodeios, o 674 é um puteiro. É um prédio meio velho, com o reboco caindo. Tem seis andares e uns bons 40 apartamentos, e em cada um deles pelo menos duas garotas oferecem seus serviços. Tem de tudo, tanto do tipo de sexo que você quiser quanto do tipo de menina que você quiser. Quando o pessoal fala isso pode parecer que só tem garota feia, mas não é verdade. E o principal do 674, é claro, são os preços: Quinze reais já te garentem alguma ação… Até menos se você for bem apessoado.
Eu já tinha ido no puteiro algumas vezes antes de me mudar pra cá, mas sempre seguindo a onda dos amigos e conhecidos. Não posso dizer que era inocente, mas também não era comum… No fim, se a gente não tava afim de ir numa balada ou num show a gente ia no puteiro. Então, quando me falaram do 674, eu, sem conhecer ninguém por aqui ainda, resolvi ir lá checar.
Você tem um guarda-volumes no térreo e aí pode ir subindo as escadas pra ir ver as meninas nos andares. Se não tão atendendo elas ficam na porta dos apartamentos chamando os clientes, provocando. Elas não são tímidas não, falam toda a putaria em voz alta mesmo, chamam pra meter, dizem que chupam tudo, levantam a saia pra mostrar que tão sem calcinha. E se você não responde e passa reto te xingam logo em seguida, chamam de corno, de viadinho, de broxa. Você tem que ficar esperto, porque senão elas te agarram mesmo e puxam pro quarto, e aí fica chato recusar o programa. Dá pra ver logo de cara quem nunca pisou num puteiro, porque os caras ficam assustados com essas coisas. Não tão acostumados com mulher querendo sexo, mesmo que seja pagando.
Minha primeira vez lá no 674 eu botei a cara de quem já conhecia o esquema, mesmo não conhecendo tanto assim, e fui logo subindo pro último andar: Aí fui passando por todas as garotas e descendo de novo as escadas com calma. Os andares mais altos não tavam muito bem não, a maioria das meninas já era mais velha, algumas sem se depilar, mas foi melhorando conforme eu fui descendo, e no segundo andar que eu conheci a Marlene.
Marlene também já era mais velha, eu diria uns 45, 46 anos, mas tava inteirona. Cabelo tingido de ruivo bem escuro, unhas feitas, várias sardas pelo corpo. Ela tava de lingerie combinando e um daqueles lenços grandões por cima dos ombros. Resolvi parar pra conversar. Ela tinha uma voz gostosa, mais grave, era mais séria que a maioria das outras garotas lá do 674. Também cobrava um pouco mais caro, mas já que eu tava quase no final do prédio e ela foi a única que tinha me chamado atenção, resolvi topar.
Entrando no quarto o 674 não era muito diferente dos outros que eu já tinha estado: Um cabide pra pendurar roupa num canto, a cama, janela… Acho que a única diferença mesmo era o banheiro, a maioria dos quartos não é suíte. Fui prestando mais atenção e fui notando que ter banheiro era parte de um quadro maior: A Marlene gostava das coisas certinhas. O lençol tava esticado, tinha incenso num canto do quarto, o papel higiênico era até de folha dupla. Acho que foi alí que eu comecei a perceber, mesmo que subconscientemente, que a Marlene era diferente das outras garotas.
A gente foi conversando enquanto eu ia tirando a roupa e ela também, fui na pia me lavar e quando voltei ela já tava me esperando na cama. Não vou dizer que o sexo foi incrível. Deu pra ver que pra ela era mais um cliente num dia normal de trabalho, e eu também não tava no clima pra dar show. Tem gente que não gosta de conversar durante a transa, mas eu não ligo, então fomos conversando o tempo todo. Contei pra ela que tinha sido demitido e que resolvi aceitar a proposta longe de casa e da família, que ainda não conhecia muita gente na cidade e tudo mais. E ela foi me contando que tinha mudado pra lá há mais de 20 anos, saindo da casa dos pais ainda adolescente pra tentar uma vida melhor numa cidade mais desenvolvida que o interior. Saí de lá mais leve, não por ter gozado, mas por ter batido um bom papo pela primeira vez em meses.
Daquele dia em diante botei na cabeça que as coisas iam melhorar pra mim, e aos poucos foram melhorando mesmo: Conheci uma gente nova, fui me inteirando dos barzinhos da moda e ganhando aos poucos a confiança do pessoal lá da agência. Ajudou bastante que, pouco depois de conhecer a Marlene, as lojas de móveis da cidade se juntaram pra fazer uma mega promoção e deu pra eu mobiliar o apê. A gente não dá valor pra uma cadeira até só ter banquinho de plástico. Até saí em um ou outro encontro com algumas mulheres que acabei conhecendo, mas nenhum deles deu em nada: A maioria queria casar, e as que não queriam eram bem frescas. A verdade é que, virava e mexia, eu me pegava pensando na Marlene.
Não remoí muito não: Se tem uma coisa que eu aprendi nessa vida é que passar vontade não leva à nada. Não tinha ainda dado um mês que eu tinha pisado pela primeira vez lá no 674 e eu já tava voltando. Fui direto pro segundo andar, mas a Marlene tava atendendo. Resolvi subir a coisa toda e matar tempo olhando as outras garotas, então quando cheguei no segundo de novo (Depois de ser muito chamado de boiola e pau mole pelas outras garotas) ela já tinha acabado. Ela não me reconheceu de primeira, mas fomos conversando novamente, primeiro falando do tempo, da greve da prefeitura, até que chegamos de novo nas nossas vidas. Contei pra ela dos móveis novos no apartamento, do novo apreço dos colegas de trabalho e tudo mais, enquanto ela me contava uns causos de clientes dela: Um mais doido que o outro. Tinha um que sempre que vinha pra cidade à trabalho passava por lá e tinha tara por pé: Queria que ela pisasse nele de salto e tudo. Tinha outro que pagava pra ela botar roupa e que fazia o programa todo com ela vestida, só descendo a calça até o joelho. E tinha um outro que passava lá só pra comprar sutiã dela usado e nem mesmo transava. Desse ela não gostava muito porque tinha sempre que ficar comprando sutiã novo, mas como ele pagava bem, ela aceitava. Acabou que eu fiquei lá o dobro do tempo normal, e a Marlene até me deu um beijo de despedida.
Depois disso foi ficando mais frequentes as minhas visitas ao 674, até que chegou o ponto que eu tava lá a cada quinze dias. Se eu chegava quando a Marlene estava atendendo eu enrolava na lanchonete alí perto ou até ia experimentar uma garota nova, mas a verdade é que nenhuma das outras que eu passei era interessante. Elas podiam ser mais novas, ou ter os peitos mais durinhos e tudo mais, mas não tinha a mesma conexão. Com a Marlene dava pra relaxar, ir com calma, conversar. Com as outras era só meter: Não tinha graça nem quando era gostoso. Não demorou também pra Marlene me conhecer, e a cada visita a gente ficava mais à vontade um com o outro. Se eu ia num dia diferente por um imprevisto qualquer no trabalho ela me perguntava se tava tudo bem, e se eu era o último cliente da noite pra ela eu ficava junto no ponto, esperando o ônibus dela passar pra ela ir em segurança.
Tinha mais de seis meses desde a minha mudança quando a Marlene começou a me contar de outro cliente dela, o Seu Dorival. Nessa época a gente já se conhecia bem, então quando eu tava indo pra lá eu mandava uma mensagem no celular dela, assim quando eu chegasse ela já estaria me esperando. Seu Dorival não era cliente da Marlene ao mesmo tempo que eu, muito pelo contrário: Tinha sido um dos primeiros clientes dela, mais de vinte anos atrás, e há quase tanto tempo tinha parado de frequentá-la.
A Marlene me contou que saiu da casa dos pais no interior aos 15 anos. Não tinha muita oportunidades lá no interior do estado, e como ela não queria casar e virar dona de casa resolveu juntar um pouco de dinheiro e ir procurar uma cidade maior pra morar. Primeiro ela tentou na capital, mas tendo saído de uma cidadezinha com menos de dez mil habitantes pra uma com centenas de milhares foi um choque muito grande pra ela e ela acabou não se acostumando. Foi indo de cidade em cidade, às vezes pegando ônibus, às vezes pedindo carona até chegar aqui. Na época a cidade tava começando a se modernizar, não muito diferente da situação de quando eu cheguei aqui, então foi fácil pra ela arranjar um emprego e um lugar barato pra morar. Com o tempo ela também foi se acostumando à vida na cidade grande, conhecendo mais o mundo, e como ela gostou daqui resolveu ficar, mesmo que fosse só por alguns anos.
Ela diz que trabalhou em vários lugares: Foi garçonete, assistente de escritório, vendedora de loja, até que foi contratada por uma imobiliária. Nessa época ela tava com 21 pra 22, e ela ficou na empresa uns dois anos mais ou menos. Então o estado entrou numa crise. O mercado imobiliário despencou, as lojas fechavam todo dia, e aí o dono da imobiliária resolveu fechar as portas. Dos colegas dela alguns foram pra capital, outros voltaram pras suas cidades, mas ela resolveu ficar e tentar alguma coisa aqui. O dono da imobiliária deu calote em todos os funcionários sem nem pagar o que devia, então a situação dela foi ficando mais grave e o dinheiro guardado foi acabando. Nessa época que uma amiga sugeriu meio de brincadeira que ela deveria ser dama da noite. Já que não tinha mais nada e ela não queria voltar pro interior, a Marlene resolveu levar a brincadeira à sério.
No começo ela disse que não gostou nem um pouco. Disse que chorava à noite quando chegava em casa, que se esfregava no chuveiro com toda a força pra tirar o cheiro dos homens. Com o tempo ela foi se acostumando e aprendendo, e em alguns meses já estava mais tranquila. Com a crise bastante gente ficou sem emprego, mas como ela mesma disse, pra uma pinguinha e uma metida o homem sempre tem uma grana. Não demorou pra gerência do 674 ficar sabendo dela, e logo depois convidaram ela pro prédio: Não só era (E ainda é) o mais famoso da cidade, como naquela época a fama era de que no 674 a qualidade era garantia, o que chamava mais clientes.
Tinha umas semanas só de 674 quando ela conheceu o Seu Dorival. Ela me mostrou uma foto dele: Era um senhor baixinho, meio barrigudo, de bigode. Ela disse que ele sempre usava suspensório sem terno e um chapéu. Naquela época já ele era bem mais velho que ela: Se ela tava no começo dos vinte ele tava na metade dos 60. Que nem eu, Seu Dorival apareceu no 674 um dia, gostou da Marlene, e aí passou a frenquentar a casa com certa regularidade. Ela diz que eles também conversavam sobre tudo durante o programa, das notícias da tevê até da economia do país. A diferença é que toda vez que Seu Dorival ia no 674 ele levava com ele uma caixinha de madeira que ele deixava num canto. Ele nunca abria a caixinha, ela nunca perguntava o que tinha dentro, e assim a vida seguiu por vários meses.
Eu e Marlene também seguíamos nossas vidas. A empresa tinha pego novos contratos bem grandes e eu fazia bastante hora extra junto com os colegas, pra dar conta do serviço todo sem perder muito do fim de semana. Não sobrava muito tempo pra mim fazer muita coisa entre trabalhar e manter a casa em ordem. Eu fazia o máximo pra não faltar com a Marlene, mas vez ou outra não tinha jeito. Ainda assim, quando a gente se encontrava, era sem tempo à perder e a gente logo ia pra atividade e de volta pras nossas conversas. Foi assim que, programa a programa, eu fui sabendo mais da história do Seu Dorival. Eu nunca achei que eu me veria numa situação dessas, logo eu que, dentre todos os meus camaradas, era o que menos ligava pra putaria, mas a vida brinca com a gente: Quase toda semana eu tava no 674, felizmente tendo o dinheiro pra bancar isso, e podendo apreciar a companhia daquela mulher. Virei frequentador assíduo de puteiro, quase numa Mil e Uma Noites moderna… A difença é que a Marlene não postergava o sexo, muito pelo contrário, contava a história com meu pau na boca.
Um belo dia, mais de um ano depois que Seu Dorival era cliente da Marlene, ele finalmente abriu a tal caixinha de madeira. Ela esperava tudo, dinheiro, jóias, documentos, até mesmo uma arma, mas na verdade o que tinha lá dentro eram cartas antigas. Seu Dorival pegou a primeira carta, deu pra Marlene, e pediu pra que ela lesse. Ela começou a ler, ele corrigiu: Era pra ler enquanto eles transavam. Ela achou estranho, mas Seu Dorival sempre tinha sido um senhor bacana, respeitador, bom papo, então ela aceitou e começou a ler. Dalí pra frente todo programa era assim: Ele chegava, entregava uma carta pra ela ler durante o sexo, e depois ia embora.
Aos poucos, a história foi se desenhando. Seu Dorival era filho de um agricultor importante na região que eles moravam. Sendo o herdeiro, foi desde cedo acostumado pelo pai a trabalhar na lavoura, conhecer o chão, fazer a colheita, e assim foi durante a adolescência toda. Foi na plantação que ele conheceu a filha de um dos funcionários do pai e, quando ele fez 18 anos e ela 19, eles se casaram. Na época a saúde no Brasil, principalmente no interior, era bem mais complicado do que é hoje, e as duas primeiras gravidez acabaram com as crianças morrendo com apenas alguns dias de vida. Isso entristeceu bastante o casal, mas eles não desistiram, e alguns anos depois nasceu uma menina. Seu Dorival não tinha foto, mas disse que ela era a cara da mãe, e que, que nem a mãe e o pai, cresceu firme na lavoura.
Com o país crescendo, ela queria melhorar a fazenda e o plantio, investir em novas técnicas que já tinham chegado nas capitais mas que ainda estavam bem longe do interior, e com isso ela resolveu deixar o pai e a mãe em casa e ir pro Rio de Janeiro estudar, pra depois poder voltar e tocar a fazenda. Seu Dorival achava desnecessário, mas a filha era geniosa e tinha o apoio da mãe, então ele cedeu. A esposa de Seu Dorival ficou muito doente e passou a escrever sempre para a filha, dizendo que ela só melhoraria realmente quando a filha voltasse pra casa. A esposa de Seu Dorival, ainda nova, morreu três anos anos depois. No último ano e meio, todas as cartas enviadas pela mãe foram retornadas, sem serem abertas, sem resposta. Seu Dorival nunca mais viu a filha.
A gente tinha parado de transar. Meio estranho o cara querer transar ouvindo outra mulher ler as cartas da esposa morta dele que eram pra filha né? E pareceu que a Marlene leu a minha mente, porque ela me disse logo em seguida que essas eram as únicas recordações das duas que ele tinha. Com a morte da esposa ele vendeu a fazenda toda e foi pro Rio de Janeiro procurar a filha, mas não achou nada. Depois de tantos anos, ele já tinha desistido e tinha criado coragem pra se matar. Foi quando ele conheceu o 674. Foi quando ele conheceu a Marlene que ele teve coragem de reler as cartas. Quando ele teve coragem de não pular da ponte ou na frente de um carro. A Marlene lembrava a filha dele, não porque elas eram parecidas nem nada, mas porque as duas foram atrás do sonho delas… Só que o sonho da Marlene deu certo.
A Marlene me contou isso segurando a caixinha de Seu Dorival. Ela me mostrou as cartas e a foto dele e começou a chorar. Foi aí que eu entendi. Porque a Marlene gostava de mim. Porque a gente conversava, porque contava tudo um pro outro, porque se via sempre. Porque mesmo eu não usando suspensório e chapéu, eu lembrava o Seu Dorival. Eu lembrava o senhor bacana que tratou ela feito gente quando todos os outros homens tratavam como bicho… A Marlene amava o Seu Dorival. Ela não tinha 45, tinha 21.
Quando as cartas acabaram, Seu Dorival foi mais uma vez no 674 encontrar Marlene. Ele agredeceu ela por tudo, deu alguns conselhos pra ela e um beijo, e disse que aquela era a última vez que ele ia lá. Ele deixou a caixinha de madeira com ela e nunca mais voltou.
Eu abracei a Marlene até ela parar de chorar… Demorou bastante. Quando ela se recompôs ela pediu desculpas por ter estragado o programa. Eu disse que não tinha problema. Ela guardou a caixinha e nós ficamos juntos, em silêncio e de mãos dadas, sentados na ponta da cama. A gente estava sem roupa. Naquela noite fiquei novamente com ela no ponto até o ônibus chegar, mas ela me pediu pra ir junto. Deixei ela na porta de casa e ela chamou um táxi pra mim. Nunca na minha vida quis tanto que alguém calasse a boca dentro do carro. Cheguei em casa, molhei as plantas, jantei e fui dormir porque tinha uma reunião logo cedo na agência. O trabalho estava agora na parte mais complicada do projeto todo, e todos estávamos ficando até altas horas no serviço, fazendo ligações e mandando e-mails o tempo inteiro. Por conta disso, fiquei umas semanas sem ir no 674. Aos poucos a quantidade de trabalho foi diminuindo conforme a gente dava conta das coisas e os projetos iam terminando, e depois de tirar uma boa semana de férias, enfim tive tempo de ir novamente no puteiro.
Marlene estava me esperando como sempre, recomposta, feliz… Pela primeira vez de verdade ela parecia feliz. Parecia que tinha tirado um peso enorme das costas. Tava até mais jovem. Ela me abraçou e me deu um beijo logo que eu cheguei, no corredor mesmo, coisa que nunca tinha feito. Ela tinha mudado o corte de cabelo, comprado lingerie nova, tinha até trocado o incenso no quarto. Foi logo conversando sobre as últimas pataquadas do Congresso e que logo mais estava planejando um churrasco na casa dela só pra amigos e queria que eu fosse também. Transamos quatro vezes aquela noite, o melhor sexo que já fizemos e um dos melhores da minha vida. Ela fez de tudo, com vontade. Ela se despediu de mim dando um tapa da minha bunda e sussurrando no meu ouvido. As outras garotas do 674 não tavam entendendo nada.
Fui no churrasco na casa dela, dançamos forró, bebemos, conheci amigos e amigas dela de fora da vida profissional. Aos poucos, fui me distanciando, aumentando o tempo entre um programa e outro… A Marlene nunca mais falou sobre Seu Dorival mas continuou contando sobre todos os clientes doidos dela: Um novato queria que ela mijasse nele. Fui mais duas ou três vezes mais lá no 674 e ela me atendeu sempre do mesmo jeito, com o mesmo tratamento especial e tudo mais, o sexo só melhorando, mas não era a mesma coisa. Era estranho. Não era a Marlene. Eu até tentei esquecer a coisa toda, não dar bola, mas não consegui, então resolvi parar de ir no 674, parar de ver a Marlene… Fiquei com ciúmes.
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