Django Livre (Django Unchained) (2)

Cinema terça-feira, 22 de janeiro de 2013

 Django é um escravo negro liberto que, sob a tutela de um caçador de recompensas alemão, torna-se um mercenário e parte para encontrar e libertar a sua esposa das garras de Monsieur Calvin Candie, charmoso e inescrupuloso proprietário da Candyland, casa no Mississippi onde escravas são negociadas como objetos sexuais e escravos são colocados pra lutar entre si.

Desde que Pulp Fiction tomou o mundo de assalto em 1994, e mudou para sempre a cara do cinema, Quentin Tarantino se tornou um dos poucos diretores que podem abrir um filme com seu nome por si só. Ele tem carta branca para incluir o que ele quiser em seus filmes. E eu não falo de carta branca por parte da industria simplesmente ou da crítica. Falo de nós, expectadores, cinéfilos em geral e principalmente de seus fãs. Tarantinesco até a medula, Django Livre é puro excesso. E isso o seu grande sucesso e também sua maior falha.

Nos primeiros 90 minutos de filme, tudo é o melhor do cinema que Tarantino já escreveu e pôde dirigir. Vemos um western perfeito, com uma trilha sonora modernista, que se encaixa perfeitamente, como todo bom filme que Tarantino resolve nos presentear. Ele ama cinema e o seu estilo próprio combinam a perfeição estética e técnica com os excessos do exploitation da década de 1970. O filme se assume como seu sub-gênero western espaguetti, sem exagerar no blaxploitation que se esperava. Estão lá os zooms, paisagens, enquadramentos e a tensão tipica dos filmes de Sergio Leone e de outros diretores do sub-gênero. A relação entre o escravo liberto Django (Jamie Foxx) e o homem que compra sua liberdade, o Dr. King Schultz (Christoph Waltz, ganhador do Globo de Ouro desse ano pelo papel em questão), é muito bem escrita e desenvolvida. Possivelmente, a melhor dupla de 2012 nas telonas. Waltz interpreta tudo com tamanha perfeição que soa como se o papel tivesse sido escrito especificamente pra ele (E talvez realmente seja). Ele merece sua indicação ao Oscar definitivamente, principalmente por se destacar tanto num filme que ainda tinha o Calvin Candie de Leonardo DiCaprio (Outro que estava genial) e pelo excelente Stephen, interpetado com maestria por Samuel L. Jackson. Praticamente, Stephen é uma espécie de tataravô do Jules de Pulp Fiction, só que aqui vemos um vilão perfeitamente odiável, daqueles que esperamos realmente que se foda no final, tal qual uma megera de novela.

A primeira metade do filme poderia ser sido um filme por si só, sem sombra de dúvida. Vemos os membros da KKK sendo ridicularizados assim como vimos os nazistas de Bastardos Inglórios, pessoas igualmente abomináveis satirizadas pelo domínio da escrita do ótimo roteiro de Tarantino. A cena dos capuzes é mais engraçada do que qualquer comédia deste ano. E o treinamento do Django pra se tornar também um caçador de recompensas é foda. Bons diálogos e boas escolhas feitas pelo roteiro.

Mas depois disso, quando Django e Schultz partem pra o objetivo principal que era resgatar Brumhilda (Kerry Washington), o filme se transforma em outro. A brutalidade da tal luta “Mandingo” e o longo e demorado caminho para Candyland mudam o tom do filme completamente. Candie, alega-se, possui a esposa de Django, que a quer de volta, mas o que se segue parece um roteiro totalmente diferente, com poucos cortes e condensado ao final iminente de uma plano mirabolante, criado por Schultz. Diferente do filme anterior de Tarantino, as personagens se tornam pouco desenvolvidas (Com exceção de Stephen e Calvin) e tudo se arrasta um pouco mais do que deveria, a sensação é de que estamos vendo um filme que tinha umas cinco horas que foram aparadas pra caber nas duas horas e quarenta e cinco do filme. Muitas cenas parecem que não vão acabar nunca, mas nem sempre isso é ruim.

Então acontece o pior: O filme inicia um clímax antecipado. Uma bagunça estrutural monumental desfaz todo o brilho do que se passou antes. O que salva o filme é um típico diálogo tarantinesco, aonde Leo DiCaprio e Samuel L. Jackson dão um show a parte. Logo, vemos tudo resolvido sem a tensão e drama tensos que cenas semelhantes mostraram em outros filmes do diretor. E quando esperamos mais um duelo mexicano, Tarantino resolve tudo simploriamente e depois lança o filme numa matança que pouco deve as melhores cenas de Kill Bill Vol.1 (SPOILER: É chocante ver dois dos melhores personagens baterem as botas e o filme continuar, mas ao contrário do que o diretor imaginou, a sensação foi de que o filme ficou mutilado sem eles).

A violência que explode no final do filme é tão ou mais explícita que em Bastardos: Interessantemente encenada, a escolha da música e tudo o mais funciona perfeitamente, mas novamente Tarantino resolve quebrar o ritmo, provavelmente pra fazer os expectadores pensarem: E agora? Somo levados então a uma terceira parte do filme, uma conclusão quase óbvia, sem surpresas (Tirando a participação especial do próprio diretor. Digamos que foi no mínimo explosiva). Mas mesmo assim, novamente Tarantino consegue mostrar na tela o que gostaríamos de ver, assim como todos vibramos quando vimos Hitler sendo feito de peneira no final de Bastardos. Mas algumas coisas não deram tão certo neste filme, como deram (Talvez por pura sorte) em seu filme anterior. Sendo outro diretor, as falhas desse filme não passariam em branco, mas sabemos que Tarantino sabe muito bem como sair das enrascadas que ele mesmo cria pra si em seus roteiros. Sem ser auto-indulgente o tempo inteiro, Tarantino seria o cineasta perfeito, mas ultimamente vemos que ele está se tornando um diretor cada vez melhor e um escritor cada vez mais fraco.

Django Livre

Django Unchained (165 minutos – Ação)
Lançamento: EUA, 2012
Direção: Quentin Tarantino
Roteiro: Quentin Tarantino
Elenco: Jamie Foxx, Leonardo DiCaprio, Christoph Waltz, Samuel L. Jackson, Kerry Washington, Franco Nero

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