Esqueça a Representatividade
Eu sei que estou meio atrasado pro debate, apesar de já ter rolado, por cima, uma ou outra coisa aqui no Bacon: Bora falar de representatividade. Aquele treco que você provavelmente vê uma galera defendendo com unhas e dentes enquanto outros dizem que é desnecessário e só é feito pra manobrar massas na velha roda capitalista do mundo.
Cara, longe de mim fazer uma análise sobre repretentatividade na mídia e no entretenimento. Na boa? Tem gente melhor que eu pra fazer isso e, mais importante ainda, eu não tô com o mínimo saco pra realmente ir pesquisar a parada. Você provavelmente pode parar de ler este texto aqui caso o que você queira seja uma análise de caso, mas se o que você quer mesmo é ver uma opinião (Ligeiramente) diferente do que rola por aí, sejE bem-vindo.
A parada é a seguinte: Eu nunca liguei e continuo não ligando pra representatividade. Mas isso quando se trata de mim mesmo.
Eu acho muito maneiro que representatividade seja um debate e que dê resultados. Não estou dizendo que o que temos hoje – de etnia, raça, cor, orientação sexual, gênero, religião, deficiências físicas e o que mais você quiser – seja perfeito e nem mesmo o suficiente. Muito pelo contrário, creio que tenhamos um longo caminho ainda a ser galgado à frente: Ter menos gente branca, menos gente hétero e menos homem na mídia não é um problema pra mim, e deixando de lado qualquer argumento bem construído à favor da representatividade, minha argumentação é muito simples: Tem gente neste mundo que não é homem, branco e hétero, e eu quero que todas essas pessoas sofram igualmente aos homens brancos e héteros com personagens de merda que sejam gays ou mulçumanos ou cadeirantes. Pra mim todo mundo merece se foder igual, e parte disso inclui ter que lidar com personagens iguais à você fazendo bosta. Então, em outras palavras, no que me toca a questão, quanto mais representatividade, melhor.
Também devo dizer que eu entendo o impacto que a coisa tem. E também não é algo que dê para negar a não ser que você seja o tipo estúpido que nega qualquer coisa com a sua burrice e mau-caratismo: Temos centenas, senão milhares de exemplos por toda a internet do que a representatividade faz, de meninos negros finalmente se vestindo de super-heroi da Marvel todos otários até minorias religiosas finalmente sendo reconhecidas pelo o que são e não através de um nome genérico qualquer (E que muitas vezes sequer está correto). O ponto é que representatividade faz uma gigantesca diferença na vida de muita gente, e isso é maneiro porque aí essa galera toda pode viver de forma mais saudável, mais completa, menos traumática e enfim parar de reclamar que personagem branco só faz merda, já que agora tem personagem judeu fazendo merda (E merda que não envolva ser avarento, diga-se de passagem) também.
Enquanto que é claro que tem muita, mas muita mesmo, do tipo puta-que-pariu-olha-só-quanta empresa, instituição, campanha e quem mais servir só falando e usando representatividade como uma conveniência nessa eterna busca por opinião popular favorável, margens de lucro expansivas e maior parcela no mercado, também é verdade que tem uma galera que toma representatividade como desculpa para foder a representatividade de outros grupos e pessoas. Em resumo, como qualquer outro posicionamento político-social, a representatividade também vai ser usada com diversas finalidades, e enquanto há processos totalmente falsos que servem só de fachada, há também os processos que acabam tendo impacto e relevância meio que “sem querer”, e que por mais cínica que sua concepção seja, o resultado final é positivo do mesmo jeito. Nada disso é novidade, e se você fica surpreso com isso tudo sinto informar-lhe mas estamos sem o brinquedo do McLanche Feliz que você quer.
Agora que eu já enrolei em parágrafos o suficiente, devo dizer (Novamente) que, para mim pessoalmente, representatividade não importa. É absolutamente verdade que, até certo ponto, eu nunca tive falta de representatividade: Eu sou homem, branco, de classe média… Na grande maioria do tempo, o que aparece no cinema e na TV e na Internet e em qualquer outro lugar é para gente como eu, feita por gente como eu, e isso significa sim que quando um personagem qualquer faz algo na tela da minha TV, eu não vou me questionar se uma mulher ou um negro ou um budista fariam a mesma coisa ou não, eu simplesmente aceito que o que o personagem fez tá beleza.
Porém, indo de frente à este ponto, há aquele argumento da empatia que vira e mexe é jogado nesse debate da representatividade: Se todos nos entedemos como seres humanos, o resto é detalhe, já que todos temos as mesmas emoções, as mesmas capacidades físicas, vivemos em sociedades semelhantes. Ou seja, se somos todos iguais, devemos nos reconhecer no outro independente das diferenças entre nós… Bem, tirando o fato de que este argumento é uma caralhada de bobagens reducionistas, é também verdade que o ponto central dele, por mais hippie que possa parecer, faz sentido. Só para deixar claro, os detalhes importam. Aliás, os detalhes fazem absolutamente toda a diferença do mundo. Porém sim, a sua tristeza é bem semelhante à tristeza do outro (E a alegria, o pesar, a ansiedade, a gratidão…). Do mesmo modo que as dificuldades que o outro enfrenta na vida podem perfeitamente ter relações com as suas dificuldades, e num mundo ligeiramente menos filho da puta todos nós teríamos realmente esta empatia pelo próximo.
Mas o que realmente faz diferença pra mim na representatividade é o fato de que eu não me boto no lugar de ninguém. E isso é algo que a minha terapeuta reclama, mas também é o que me permite entender que eu não preciso me ver no lugar do outro para conhecer sua história, entender suas opiniões e aprender com seus erros e acertos. Eu aceito que a história do outro não precisa me incluir. Eu não preciso estar no lugar da pessoa, eu consigo dialogar com ela daqui onde eu estou mesmo. Porque o que importa não é sentir na pele, mas sim dar este espaço e a oportunidade para o outro mudar a minha vida.
E porra, pra mim isso é algo tão óbvio e que ainda assim eu vejo tanta gente brigando… Tipo véi, cê não precisa ser mulher pra entender que, quando uma personagem feminina trans fala que estupro seguido de morte é um problema real, o problema É REAL. Cara, eu sou um completo idiota e já precisei apanhar bastante pra aprender algumas coisas (E muito provavelmente precisarei apanhar mais nesta vida), mas tantas vezes me parece que tem gente que literalmente SÓ aprende se fodendo. MEU BRÓDER, APRENDA COM OS OUTROS. É claro que tem vivências que eu jamais terei. Eu jamais saberei realmente o que é precisar de cotas pra passar numa universidade ou o que é alguém me chamando de japonês só por ter olho puxado ou ainda andar com uma faca por medo de ser espancado sem motivo, mas velho, tem GENTE PRA CARALHO dizendo que isso acontece. Que é fidedigno. Que se chegou na novela é porque na vida real a parada é muito mais antiga, mais pervasiva e mais grave.
Representatividade só existe porque a gente não está disposto à aceitar as experiências dos outros como verdadeiras.
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