Ironia fina é pouco
Cambaleando, Lúcio se dirigiu no escuro ao computador adormecido. Clicou no botão de boot e se dirigiu ao banheiro, onde admirou seu rosto adolescente. O rosto magrelo e com resto de amassados do travesseiro, contrastante com o cabelo loiro-avermelhado, lhe lembrou um personagem de The Sims.
Voltou ao quarto, abriu Fallout 3 e começou a jogar. Eram 5h45.
No andar de cima, os pais ressonavam.
Algumas horas depois, Lúcio estava explorando um cenário alternativo, enquanto a mãe preparava o café da manhã. O pai ouvia as notícias matinais na televisão.
… enquanto isso, em Seattle, houve um problema generalizado nas antenas responsáveis pela distribuição de sinal telefônico. Os cidadãos estão em alvoroço, tentando se comunicar por meio de office-boys e serviços de entrega. Os profissionais do setor estão procurando soluções para o problema, cuja origem segue desconhecida.
“Lúcio, vem tomar café!”
O menino pegou seus fones de ouvido, plugou na entrada de áudio e continuou jogando.
“LÚCIO, CAFÉ!”
Quanto mais o filho ignorava, mais Dona Edite gritava. E o pai, já puto, brigava com a esposa por continuar na mesma briga todos os dias.
“Porra, tem é que tirar essa merda de computador dele. E o Playstation. Moleque mimado.”
“Ah, mas ele precisa do computador para a escola…”
“Tomar no cu”
Lúcio não ouviu a série de explosões, mas seus pais sim. Os dois abandonaram seus cafés e saíram pela porta dos fundos, onde viram um céu vermelho-sangue.
Um etê verde segurando um salame gritava “Cês são tudo noobs, NOOOOOOOOOOOOOBS”.
Lúcio estava executando a morte de uma formiga gigante no jogo, quando o planeta começou a implodir lentamente. Eram 11h32. O etê continuava lá, rindo sadicamente do desespero humano. Apontou o salame estrategicamente para Lúcio, que continuava no assassinato de pobres indefesos (aham) insetos, e começou a tagarelar.
“Véi, o bicho-grilo tá lá, jogando um negócio baseado no apocalipse e não percebe que essas tretas tão acontecendo. MERECE MORRER MERMO”
Materializou o salame entre os miolos de Lúcio, que morreu após explodir virtualmente sua cidade com uma bomba atômica.
Morre, inútil.
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