Meu Amigo Totoro (Tonari no Totoro)

Filmes bons que passam batidos terça-feira, 20 de março de 2012

 Mei é uma jovem que encontra uma pequena passagem em seu quintal, que a leva à um lendário espírito da floresta conhecido como Totoro. Sua mãe está no hospital, e seu pai divide o tempo entre dar aulas na faculdade e cuidar de sua mulher doente. Quando Mei tenta visitar a mãe por conta própria, se perde na floresta, e só o grande e fofo Totoro pode ajudar a menina a achar o caminho de volta para casa.

É, eu sei. Vou falar de um anime, ato normalmente passível de expulsão imediata. Mas calma, é uma obra do Hayao Miyazaki. Ok, isso não deve ter ajudado muito. O cara que fez A Viagem de Chihiro, melhorou? E ele tem crédito, sendo um dos poucos expoentes da estranha terra do sol nascente que não é assustadoramente bizarro. Tá, até é. Mas no bom sentido. Enfim, o filme, o filme. O Meu Amigo Totoro é a segunda obra do Miyazaki. E apesar de ter muitas semelhanças com os seus futuros e mais famosos projetos, diferentemente deles, cujas sutilezas costumam atrair mais adultos do que crianças, esse é um filme essencialmente infantil. De novo, no bom sentido.

Pra começar, as crianças agem como crianças, o que já garante boa parte da coisa. No início do filme, Mei e Satsuki, irmãs de 4 e 10 anos, se mudam com o pai pra uma casa no meio do mato. No caminho, a gritaria hiperativa em japonês das duas é quase irritante, mas a qualidade da animação é tão grande que dá uma simpatia infantil irresistível às crianças. Tipo o que acontece com aquela menina menino criança do Cowboy Bebop. Aliás, único desenho japonês além do Dragon Ball que prestava, certeza.

Nos momentos seguintes, o filme nem parece cria do diretor que faria O Castelo Animado, visto que passa um tempo considerável sem nenhum elemento fantástico, surreal ou algo do gênero. Mas tudo isso muda quando Mei, brincando no jardim, se depara com uma espécie de coelho/hamster, e passa a persegui-lo. Ela acaba sendo levada pra uma floresta próxima, caindo num buraco (Numa das várias referências à Alice no Pais das Maravilhas) e aterrisa em cima de um coelho/hamster/coruja (?) gigante. Que na verdade é um espirito protetor da floresta ou algo assim, chamado de Totoro. Porque Mei pronunciou troll errado, numa piada que só deve fazer sentido em japonês.

Nessa altura, o filme já é uma bela aventura infantil. E é aí que o diretor começa a desconstruir algumas regras que a gente costuma ver em absolutamente todos os desenhos. Por exemplo, quando as meninas vão dizer pro pai que viram um fantasma. Esse é o momento em que o adulto xinga todo mundo dizendo que aquilo não existe e deixa elas de castigo. Mas inesperadamente, o pai acredita nelas, fazendo-as se sentir especiais pelo simples fato de terem visto Totoro. Aqui, as crianças não são adultos em miniatura e os mais velhos fazem de tudo pra que isso continue desse jeito. Outro momento genial ocorre quando fica claro que não há um limite definido entre o que é real ou não. Os resultados das aventuras de Mei e Satsuki sempre deixam alguns resquícios que provam o que ocorreu. Mas de uma forma com que possam ser encarados como simples coincidência, deixando tudo meio ambíguo.

Pra completar, quando parece que tudo vai parar por aí, o filme apresenta uma carga dramática surpreendentemente profunda. No decorrer da história, a gente fica sabendo que a mãe das crianças tá no hospital, com alguma doença indefinida. A principio, ela vai voltar pra casa em breve, mas um telegrama do hospital chega avisando que tem alguma coisa errada. E é tudo tão bem construído que gente acredita que ela realmente vai morrer. E isso é triste pra caralho. Tipo, porra, o que vai ser dessas crianças quase reais agora?! E fica pior, enquanto Satsuki sai pra procurar um telefone e ligar pro pai, Mei bota na cabeça que precisa sair correndo e ir pro hospital levar uma espiga de milho pra mãe e acaba se perdendo no caminho.

 Isso mesmo, milho.

E por mais que tudo seja leve e feliz e colorido, a mudança de clima é tão bem orquestrada que dá pra ficar um tanto quanto apreensivo com o possível desfecho. Pela qualidade da história que se desenvolveu, um final feliz não é mais uma certeza. Isso, aliado a ambientação desse universo que não conhecemos totalmente, deixa a trama realmente emocionante. Até a simples cena das crianças sozinhas na parada de ônibus tem um peso que consegue perturbar levemente o expectador. Ao mesmo tempo, o filme é bastante engraçado, cheio de piadas visuais. O que pra mim, é a coisa mais importante num filme pra crianças. A cena dos guarda-chuvas, por exemplo, e sensacional.

Com elementos incrivelmente simples, o diretor consegue contar uma história interessante sem apelar pra números musicais (Só nos créditos iniciais e finais), romances, e nem mesmo um vilão, coisas que parecem impensáveis depois de tantos anos presos à formula Disney. Tudo amarrado por um visual que deixa os personagens genuinamente humanos, algo presente apenas nos outros trabalhos do Miyazaki, do Sylvain Chomet e nos mais altos momentos da Pixar. E isso que o filme é lá de 1988, mesmo ano do Akira, que teria o estilo copiado por todos os animes das próximas décadas.

Meu Amigo Totoro

Tonari no Totoro (86 minutos – Aventura, Fantasia)
Lançamento: Japão, 1988
Direção: Hayao Miyazaki
Roteiro: Hayao Miyazaki
Elenco: Noriko Hidaka, Chika Sakamoto, Tanie Kitabayashi, Hitoshi Takagi, Machiko Washio (Vozes).

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