O Bebê de Rosemary (Rosemary’s Baby)
De um filme de terror, todo mundo sempre espera que ele tenha algo de sobrenatural, um assassino psicótico ou um monstro terrível. Filmes como Psicose (1960), O Iluminado (1980) ou O Exorcista (1973) provam que esse clichê existe. Mas existe um filme que assusta qualquer um e foge desta presunção. O Bebê de Rosemary destoa e intriga cinéfilos e críticos do mundo inteiro há mais de 40 anos. Regras sempre existem e sempre existirão, mas é claro que regras servem também para serem quebradas. Um dos filmes mais assustadores de todos os tempos, a obra maior de Roman Polanski chocou o mundo em 1968 justamente por esconder o que os outros filmes fazem a maior questão de mostrar logo de cara. E por causa disso, o filme envolve e assusta o espectador como nenhum antes dele conseguiu. Poucas vezes antes dele, o terror foi tão angustiante como Polanski o fez ser em O bebê de Rosemary.
Visto hoje em dia, o filme ainda assusta, apesar de não ter nada demais. Atuações convincentes de todo o elenco, o filme vai se desenvolvendo lentamente, quase parando. A curiosidade hitchcockiana vai subindo devagar, até atingir níveis estratosféricos. Era a estreia de Polanski em Hollywood, depois dos seus primeiros filmes, ainda na Europa. A história inquietante da quieta e boa esposa Rosemary Woodhouse (Brilhantemente interpretada por Mia Farrow, que deve ter tirado da fossa a inspiração, por ter sido largada por Frank Sinatra), que vive submissa ao marido egocêntrico ao extremo Guy (John Cassavetes). Ela se muda para um antigo prédio nova-iorquino, aonde eles conhecem o casal de idosos intrometidos Minnie (Ruth Gordon) e Roman Castevet (Sidney Blackmer). Tudo muito normal. Mas o modo como estes personagens se entrelaçam na tela, a busca de Guy em ver sua carreira deslanchar como ator e o desejo deles de terem o primeiro filho no aconchego do local contrasta com estranhos boatos acerca dos ex-moradores. Muito mistério.
Um inesperado suicídio, uma invasiva amizade, a gravidez de Rosemary, o controle dos Castevet sobre suas vidas e o mal-estar da gravidez de Rosemary (Não solucionado pelo médico indicado por Minnie), tudo leva a crer que algo de macabro está acontecendo ou prestes a acontecer. O desespero dos espectadores é latente. Assim como em Coração Satânico, o clima de mistério se dissipa aos poucos e a sensação aflição de que algo vai dar errado só aumenta cena a cena.
A direção afiada de Polanski conduz o filme no ritmo certo (Apesar de alguns cortes serem meio ríspidos), seguindo o roteiro baseado em livro homônimo de Ira Levin (Roteiro esse escrito pelo próprio Polanski) fazem do filme um terror psicológico minuciosamente construído, desviando-se totalmente de tudo que já tinha sido feito anteriormente no gênero e aproximando o filme do suspense do mestre Hitchcock. É assustador perceber que os fatos e não as alucinações justificam tanto as desconfianças de Rosemary quanto a do público. Apesar do filme ter uma aura sombria e peculiar, não é o sobrenatural que assusta mais, mas simplesmente a paranóia que surge na protagonista. A trilha sonora merecia uma resenha a parte. As vezes delicada e as vezes intensa, a trilha criada por Christopher Komeda cria o clima certo para o filme, tocando sempre em seus melhores momentos. Tudo é propício ao susto, mas as situações só se tornam mais e mais tensas no decorrer da história.
É impressionante perceber o quanto Polanski era um realizador diferenciado dos demais de sua época. Ele sacrifica todas as possíveis saídas comerciais para oferecer um final apoteótico, que é nada menos do que um dos mais ousados da história do cinema. Uma provocação sem precedentes. Mesmo com todas as dicas óbvias deixadas pelo roteiro, é impossível prever o destino de Rosemary, muito menos a sua reação ao lidar com tudo aquilo. Volto novamente a citar Coração Satânico ao comparar a ousadia e o comprometimento com um roteiro bem delineado e sem frescuras ao finalizar um filme sem o desejo estridente de simplesmente chocar de graça, mas chocar mais do que qualquer outro filme de terror poderia chocar.
SPOILER AQUI, SE NÃO VIU O FILME NÃO LEIA
O final do filme é ainda mais perturbador quando descobrimos que a esposa de Polanski, a atriz Sharon Tate (Que gravou a voz da belissima canção título do filme), foi brutalmente assassinada cerca de um ano após o lançamento do filme, em 9 de agosto de 1969, quando a casa do diretor foi invadida por quatro integrantes da Família Manson (Charles “Tex” Watson, Susan Atkins, Linda Kasabian e Patricia Krenwinke), a mando do psicopata Charles Manson. Sharon, que estava grávida de oito meses do primeiro filho do casal, foi estuprada e esquartejada pelos integrantes da seita (E reza a lenda que seu filho foi arrancado de suas entranhas e devorado pelos malucos satanistas). Além de Tate, foram mortos também Steven Parent, Abigail Folger, Wojciech Frykowski e Jay Sebring. Tenso. E quanto ao spoiler, eu só escrevi isso pra garantir que vocês lessem essa última informação.
O Bebê de Rosemary
Rosemary’s Baby (136 minutos – Terror)
Lançamento: EUA, 1968
Direção: Roman Polanski
Roteiro: Roman Polanski, baseado no livro de Ira Levin
Elenco: Mia Farrow, John Cassavetes, Ruth Gordon, Sidney Blackmer, Maurice Evans, Ralph Bellamy, Victoria Vetri, Charles Grodin
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