O Segredo do Kelpie (Aya Imaeda)
Pra encerrar (Por enquanto) minha ligeira passada pelo trabalho da Editora Draco, resolvi ler o romance O Segredo do Kelpie: Saca aquela lenda escocesa do cavalo carnívoro que afoga pessoas nos rios e lagos? Pois então, e se um kelpie fosse capturado?
Como é de se esperar com mitos, o kelpie tem várias e várias versões, vertentes e variações, então se você for mala feito eu já adianto que este não é o tipo de livro pra você: O Segredo do Kelpie é um romance, não um estudo mitológico, então a coisa toda é refletido neste pressuposto. Também vale dizer que, no fim das contas, a autora tem uma história para contar, então concessões próprias à ela e não baseadas na mitologia também existem.
O livro narra a história de um kelpie que, por não ter nada pra fazer, resolve achar uma esposa. É aí que ele encontra Aileen… Que dá um balão nele e o obriga a trabalhar na fazenda da família, preparando o campo, plantando batatas e, pela primeira vez na vida, trabalhando ao invés de ficar por aí matando gente. Com o tempo, conhecemos mais da família de Aileen, do mundo das fadas (No livro grafado como “Tir nan Og” contra o “Tír na nÓg” tradicional) e, principalmente dos kelpie. A coisa toda é escrita em primeira pessoa, com a história sendo narrada pelo próprio kelpie, e essa é a parte interessante do livro: Ver, através dos olhos de um faerie, como é o mundo dos humanos.
A história em si é bem simples e previsível, com o livro passando a gigantesca maioria de seu tempo narrando a estranheza que o mundo dos humanos causa no kelpie e em outras criaturas mitológicas. A conclusão da história se dá de forma até meio abrupta, de forma semelhante à muitos mitos, mas que num livro poderia ter sido um pouco expandida e melhor detalhada… Eu também não sou grande fã do epílogo do livro: Bem clichê, pra falar a verdade.
Falando no epílogo, ele é um dos poucos capítulos do livro não contados da perspectiva do kelpie, mas sim de Aileen: São capítulos que existem muito mais pela necessidade de continuar a história quando o kelpie estava impedido de fazê-lo, o que na verdade diz que foi um recurso utilizado para não pular tempo na história para quando o kelpie pudesse continuar sua narrativa… Não é errado nem nada, mas parece muito mais um remendo que uma decisão narrativa. Se apenas o epílogo fosse por Aileen a coisa seria mais interessante, mas mesmo quando é ela a narradora a gente, leitor, não conhece mais da personagem de forma como fazemos com o kelpie: Acaba sendo um recurso subutilizado.
Como sempre a Draco entrega um livro bem feito, com bom papel, boa diagramação e tudo mais. Eu também gosto bastante da arte de capa, num bom balanço entre o simples e o rebuscado. Peguei uns dois ou três erros de revisão no livro todo: É o tipo de coisa que acontece, independente do tamanho da editora e de quantas vezes o livro é revisado, mas que sempre acho interessante pontuar. Sendo o livro de 2017 e eu já tendo outras obras da editora (Mais recentes inclusive), sei que é uma parada que eles buscam resolver. Com 232 páginas, O Segredo do Kelpie é um livro bem tranquilo de se ler: Fui bem com calma, levando uns bons 20 dias nele, mas a verdade é que se você estiver com pressa, nada que algumas horas não façam.
Este é o primeiro livro da Aya Imaeda, sendo que ela participou anteriormente de outra coletânea da Draco e desde então esteve também em Duendes: O ponto forte dela é, de longe, criar uma ambientação para suas histórias. Você pode questionar decisões de direcionamento da história, mas em momento algum em Kelpie vai se pegar pensando que o mundo criado por ela falta alguma coisa. Os personagens também são bem desenvolvidos: É particularmente divertido ler os trechos, em Kelpie, do Brownie (Um faerie com mania de limpeza) ou do Dr. Beaton.
Vale aqui um parágrafo à parte pra falar de dois personagem: O primeiro é o tio de Aileen, John. Eu não tenho problema algum com o personagem querer matar o kelpie (Aliás, John em si é um personagem legal), eu tenho um problema com o porquê: É extremamente clichê. Eu sei que isso é referência direta à tantas e tantas lendas ao redor do mundo, mas na boa? Tá batido demais. O segundo personagem é Donnchadh ou, como habilmente apelidado pelo kelpie, Desagradável. Durante o livro todo ele é o pretendente babaca de Aileen, e essa parte da história tem um desenvolvimento bem legal, sendo, para mim, o maior ponto de tensão no livro todo porque afinal de contas é um romance e o mocinho não ia morrer no final. E cara, eu gostei bastante de como a situação do personagem foi resolvida. Foi um balde de água fria que casou perfeitamente com o resto da história… O que eu acho ruim é que há o desenvolvimento da tensão… Que nunca passa de um “e se?”… Tipo… Eu queria que o Desagradável fosse mais que só desagradável, que todo o tempo de desenvolvimento tivesse levado à um “debate” sobre a situação apresentada.
Eu não sou grande fã de romances que brincam com mitologia, mas O Segredo do Kelpie se descata por ser pessoal: A escolha pela primeira pessoa vai muito bem, e aliada ao clima leve que leva o livro todo (Ou quase todo), dá à história uma cadência quase que natural pra coisa toda. É um livro que passa boa parte de seu tempo falando em homicídio e faericídio e que, ainda assim, dá tranquilamente para ler para crianças ou pra tua avó. O Segredo do Kelpie não tenta em momento algum ser um épico, e é justamente isso que o diferencia de tantos outros livros com a mesma premissa básica. Se você gosta deste tipo de história, vai fundo fundo, rio, kelpie? Pegou?. Pra mim, me serve muito mais pra querer ver um maior desenvolvimento da Aya Imaeda… Fico no aguardo.
O Segredo do Kelpie
Ano de Edição: 2017
Autor: Aya Imaeda
Número de Páginas: 232
Editora: Editora Draco
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