O Voo (Flight)
Whip Whitaker é um gato ótimo piloto de avião comercial, que enfrenta problemas com consumo de álcool e drogas. Após um grave acidente de avião, em que Whip salvou diversas vidas, seus segredos ficam expostos e colocam em risco sua carreira e liberdade.
O Voo, filme dirigido por Robert Zemeckis, me atraiu assim que coloquei os olhos na sinopse, enquanto folheava o jornal. Primeiramente porque gosto pra caramba do diretor, que é o mesmo de clássicos como De Volta Para o Futuro, Uma Cilada Para Roger Rabbit e Forrest Gump. Segundo, eu me pelo de medo de voar. Minha boca fica seca e meu coração dispara só de pensar em colocar meu lindo corpinho albino dentro de um avião. É algo inexplicável, beira o irracional. Prefiro viajar no Titanic a embarcar em um Boeing. Me pareceu, portanto, uma idéia boa potencializar ainda mais o meu pavor. Comprei o ingresso.
Denzel Washington é o piloto de aviões comerciais Whip Whitaker. Um profissional fenomenal com apenas um defeito: Vive bêbado e drogado. Com uma rotina insana de trabalho e uma péssima relação com a ex-mulher e o filho adolescente, ele se joga no álcool e nas drogas como se fossem o botão de ejeção de um avião em queda livre. Sem falar nas noites em claro fazendo sexo selvagem com uma comissária de bordo, afinal estamos falando de um boy magia e tanto [Nota do editor: Boy magia? WTF?]. Desculpa pai, desculpa Brasil, mas eu pegava. A primeira cena do filme já joga na sua cara o estilo de vida do piloto, o que te faz refletir sobre todas as viagens que você já fez e agradecer por estar vivo. Vai saber que tipo de pessoa estava responsável pelo avião enquanto você desconfortavelmente tentava dormir na classe econômica?
Essa válvula de escape nunca trouxe conseqüências a sua vida profissional, até o dia em que sua aeronave sofre um grave acidente. Apesar de fazer uma manobra cinematográfica – como não poderia deixar de ser, visto que se trata de um filme – e salvar 96 das 102 pessoas a bordo, se inicia uma caça as bruxas, afinal, o que causou o queda? A investigação começa e todos os problemas vêm à tona depois de um teste toxicológico acusar que, durante o vôo, Whip estava completamente chapado. Nesse momento, sua carreira entra em risco e o piloto precisa enfrentar uma batalha interna entre sustentar a confortável face de herói e assumir a responsabilidade pelos seus atos.
O filme é o tempo todo pautado pela ética, ou falta dela. É impossível ignorar a frieza da companhia aérea e do sindicato dos pilotos em relação aos fatos e as vítimas. Todo mundo visando unicamente livrar a própria cara, com medo de literalmente pagar o pato, ou melhor, as indenizações. O próprio Whip, completamente despido de fé, encara uma sessão de reza ao lado de seu co-piloto – testemunha do acidente e do comportamento do comandante – para tentar se safar e garantir um testemunho favorável. A discussão atravessa a tela e chega ao público que, apesar de reconhecer os erros de Whitaker, não consegue deixar de torcer pela sua redenção ou simplesmente para que ele se safe.
Os momentos de ternura ficam a cargo de outra viciada, Nicole, que Whip conhece na escada do hospital onde ambos estão internados. Ele, por conta do acidente. Ela, por overdose de heroína. Obviamente rola um clima, porque não há nada mais sensual nessa vida do que aquelas roupas de hospital e uma experiência de quase morte. Os dois passam a viver juntos no sítio da familia Whitaker e a se relacionar. Sim, exatamente nessa ordem. Ao contrário de Whip, ela é capaz de reconhecer-se viciada e quer se livrar de seus demônios, tentando levá-lo com ela para o caminho da cura. O piloto é o oposto. Parece achar que é superior a esse estilo de vida e que o abuso de drogas e álcool não interfere em sua rotina. O medo que a ex viciada tem de chegar ao ponto de negação e acomodação em que o namorado/marido/pau amigo chegou é comovente. Por mais que haja sentimento, qual é o preço que se paga por se relacionar com alguém que possui as mesmas fraquezas e defeitos que você?
O filme é longo, com 138 minutos. Fiquei com medo de me entediar e de todos os restaurantes fecharem (O que de fato aconteceu). Não acho que precisava ser tão longo para explorar a história como fez, no entanto também não cansa. É bastante envolvente e, logo eu, viciada em comida e celular, não me atrevi nem a comprar pipoca e tampouco a olhar o Facebook, e-mail ou Whatsapp. A excelência do elenco ajudou. Eu pessoalmente gostei muito do advogado representado por Don Cheadle e do traficante gente boa que arranca as melhores risadas do filme, incorporado por John Goodman. Denzel Washington é sempre um ótimo ator representando, bem, Denzel Washington. Ultimamente seus papéis tem me dado o desagradável sabor de déjà vu. O que não significa que não goste dele ou que o culpo. Ele simplesmente tem sido escalado para interpretar personagens semelhantes. Não me dediquei muito esse ano aos indicados ao Oscar, até porque todo ano é a mesma coisa, mas arrisco dizer que Denzel seja o azarão no quesito melhor ator.
Não gosto de sair da sala do cinema me sentindo um zumbi, sem ter o que refletir sobre o que foi visto. E apesar de não ser o dramalhão boooooring iraniano que os meus amigos cinéfilos adoram dizer que gostam, o filme rendeu alguns bons momentos de papo na mesa do bar. Com uma historia comovente e tensa, além de muito bem dirigido, o filme agrada. São nuances bem delicadas que marcam as mudanças na personalidade de Whip ao longo das horas de filme. A sensação de transformação gradativa do personagem é a segunda melhor experiência diante da telona. A primeira é dizer que eu sempre tenho razão e que avião é meio de transporte para noobs. Navio FTW!
O Voo
Flight (138 minutos – Drama)
Lançamento: EUA, 2012
Direção: Robert Zemeckis
Roteiro:John Gatins
Elenco:Denzel Washington, Don Cheadle, Bruce Greenwood, John Goodman, James Badge Dale, Melissa Leo, Tamara Tunie e Nadine Velazquez
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