Preciso falar sobre Gregório e não peço desculpas por nada
Como você, enquanto feminazista, acreditou no texto mequetrefe daquele esquerdomacho do Gregório Duvivier?, me perguntaram algumas amigas por inbox, depois que – além de compartilhar sua declaração à ex no Facebook – fiz textão refletindo sobre. Não sei. Anarcomacho, direitomacho, centro-direito macho. Macho é macho. Ser eleitor do PT não faz dele nem santo, nem diabo. E, enquanto heterossexual, já tive que dar o benefício da dúvida para homens menos poéticos, famosos e influentes entre jovens do que Gregório. Sobrou muito Kleenex borrado de maquiagem pra contar história, mas ninguém me julgou por isso.
O humor de Gregório não me agrada. Tampouco sua carreira como colunista, humorista, escritor e ator. Idem para Clarice Falcão. Sua música me interessa quase nada. Assim como sua comédia, que conheci através do Porta dos Fundos e por lá ficou. Mesmo assim, Gregório & Clarice conseguiram me fazer refletir. E, apesar de estupefata por esse feito, não me envergonho por ter sido tomada de assalto pelo texto e ter visto tudo de mim, ali.
É claro que existem falas problemáticas. Como quando ele diz que gostaria de ter tido um filho com ela, para manter o laço entre os dois eterno. Provavelmente, na tentativa de ser romântico, ele se esquece do peso que é a maternidade para a mulher e do quão estúpida é essa afirmação. Que ser pai é/deveria ser criar, trocar fralda, acalmar cólicas, pagar escola, buscar na escola, conferir o boletim cheio de notas vermelhas, se preocupar porque o rebento foi pra night, chegou tarde e sequer se deu ao trabalho de avisar. Não é um elo indissolúvel à toa. Tampouco subterfúgio para possuir, também, a mãe. Então, quando fala sobre o que aprendeu com ela sobre machismo, alguma aula ele faltou. Querido, acorda! Vocês foram casados, pariram curtas pseudo-engraçados, dividiram dezenas de projetos. Seus nomes estão amarrados, pra sempre, em nome de jesus. Juntinhos. Não há separação de corpos, ou alma, que de jeito.
Houve também muita preocupação sobre o que Clarice estaria pensando disso tudo. E eu acho que ela está ótima, apesar de não ter perguntado. Quem crucifica Gregório por devassar a intimidade do casal também não perguntou, então me sinto no direito de inferir. E acredito que estava ciente, de antemão, que ele faria essa coluna. Os dois estão lançando Desculpe o Transtorno, filme em que contracenam como par romântico. Ambos são artistas e contam com assessores. O filme tem uma assessoria de imprensa própria, também. Esse texto certamente passou pelas mãos do atendimento e por instâncias superiores, como a própria produtora, até ser aprovado. Especialmente por ter sido veiculado em um dos maiores jornais do Brasil e não através textão de Facebook. Não há mídia melhor do que a espontânea. E, ainda que tenha sido uma jogada de marketing, olha que sacada legal: To falando dessa bagaça pela 18ª vez. As adolescentes suspiraram, os homens cuspiram e o longa tá na boca do povo. Golaço! É tetra! Melhor do que qualquer nota no Anselmo.
Quanto à Clarice, acredito que ela saiba, como todas nós deveríamos saber, que não somos obrigadas a nada nessa vida. E a coluna, por mais que revele uma intimidade que não sabemos muito bem se era assim, não é uma arma apontada para a cabeça da cantora. Os shippers pedindo insistentemente, em suas redes sociais, para que os dois voltem não são responsabilidade nenhuma do ex-casal, mas a consequência de sua fama. E duvido que consigam mobilizar algo mais do que uma caravana para o cinema, esperançosos para ver Grelice (RISOS) acontecer de novo.
Uma conhecida disse, com toda a razão que, quando um relacionamento termina não pelas nossas mãos, mas pelas do homem, temos que levantar a cabeça, segurar o choro e fingir uma normalidade inexistente para não bancarmos as loucas. Um esforço hercúleo de internalizar frustrações só para não parecer incômoda. Todas as vezes que me apaixonei e deu errado eu sofri calada, fiquei na bad. Chafurdei na lama. Silenciosa. Enquanto isso, homens se sentem no direito de matar, ameaçar, mutilar. Apenas diante da afronta, do questionamento. Não respondem, explodem. Negam. Sequer se desculpam pelo transtorno. E alguns escrevem. Mas Clarice e Gregório não estão na bad. Ambos já iniciaram e terminaram outras relações. Foram vistos no Leblon ou Baixo Gávea refazendo suas vidas uma dúzia de vezes. Estão lançando um filme, alavancando a carreira e, apesar de serem ricos de berço, engordando o próprio pé de meia, o que não faz mal a ninguém. E deixo claro: Cada um o seu.
Acho que não preciso repetir que não é sobre eles. A “arte” nunca pertence somente ao autor, é obra também do espectador. Observar, refletir, ressignificar e enxergar-se como em um espelho é a mais natural das reações. Fazemos isso com filmes, livros, músicas. E com o textão do Gregório Duvivier. É quase orgânico, inevitável. Tanto uma forma de comunicação, como de autoanálise. Portanto, vê-lo falar com carinho da ascensão e queda do romance com a cantora deixou de ser sobre eles quando passou a ser sobre mim. E sobre as centenas de pessoas que engoliram bem e as demais centenas que não engoliram at all. No frigir dos ovos, eu não sei se ele a traiu mesmo, como dizem, e não sei o que ela pensa a respeito. Imagino que, certamente, não viviam em um comercial de margarina. E, oxalá, que tenham construído o amor e não tenha sido a primeira vista, como ele relatou. Esses são os mais fracassados. O que há de real ou invencionice na vida a dois, só o casal sabe. Se ele a conheceu no jazz, a amou desde sempre e comprou móveis que não cabiam na casa, com a desculpa que o fez porque é de humanas, jamais teremos certeza.
O fato é que fazemos mais esforços para expurgar pessoas e apagar histórias do que encarar o adeus de frente. Preferimos odiar a quem já amamos e renegar alguém de quem já gostamos do que fazer um trabalho de forminguinha para transformar as relações, não destruí-las. Somos tão preguiçosos e indispostos que até fizeram um filme* sobre isso. E, ainda que seja marketing, maquiagem e excessiva romantização para levar mais pessoas ao cinema, se causa reflexão, a menor que seja, já é relevante.
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