Sherlock
Não faz muito tempo que eu costumava vir cheio de esperanças falar sobre a televisão, devido a qualidade das novas séries que tavam saindo por aí e tudo o mais, em contrapartida ao que vinha sendo produzido no cinema, por exemplo. Porém, dessa vez a onda quebrou mais cedo que o normal e bastou alguns meses e alguns season finales pra que, de novo, o ser humano médio voltasse a rotina de acompanhar uma ou duas séries decentes e se resignar às eternas reprises da TV durante as refeições. Mas existem algumas pessoas mais afetadas pelo absurdo da nossa época não se contentam mais em simplesmente assistir alguma coisa enquanto comem, elas têm a necessidade de assistir algo bom pra conseguir se alimentar propriamente. E usam esse tempo de entressafra pra garimpar outras séries obscuras que podem ter passado despercebidas na internet. O que não tem nada a ver com o fato de eu ter feito justamente isso e encontrado Sherlock, obviamente.
Então, obviamente, de novo, o seriado trata do detetive inglês criado pelo Sir Arthur Conan Doyle, que, enfim, todo mundo viu os filmes do Guy Richie. Aliás, provavelmente foi justamente por isso que eu ignorei essa nova releitura do personagem, lá em 2010. Mas enfim, de novo (De novo), o que importa é que essa série, ou minissérie, já que cada temporada tem só três episódios, é muito mais interessante do que parece inicialmente, com base no princípio extremamente simples utilizado: Trazer o Sherlock Holmes pro século XXI. Nessa vibe de modernizar o personagem, os realizadores também aproveitaram pra aproximar todo universo dos livros da ~realidade~. Por exemplo, sendo uma pessoa que consegue deduzir todo o passado/estado emocional/etc da pessoa com base na aparência dela, é provável que Sherlock vá ter alguns problemas. E aqui o efeito colateral dessa genialidade é a sociopatia, no caso.
Ou seja, a única motivação (Ao menos inicial) de Sherlock é o tédio, já que o cérebro dele funciona muito mais rápido que o das pessoas normais. E essa característica extra conseguiu deixar a relação com o Dr. Watson, militar que acaba de voltar do Afeganistão e está tendo dificuldades em se ajustar a vida normal, bem mais divertida. Os primeiros episódios servem justamente pra construir essa amizade, enquanto começamos a conhecer a rotina do detetive no mesmo ritmo que Watson o faz. Mas o ponto principal são os crimes a serem resolvidos, claro. Que começam a ficar cada vez mais complexos a partir do 2° episódio. Porque cada episódio tem uma hora e meia, parece que a BBC finalmente sacou a televisão.
Felizmente, Sherlock não segue essa mecânica de um novo mistério resolvido a cada episódio e tal. Quer dizer, no fundo até segue, mas a coisa funciona por causa da introdução de outros personagens recorrentes “a altura” do detetive, como o irmão mais velho dele, Mycroft Holmes, e é claro, Jim Moriarty. Que tiram o protagonista da zona de conforto com uma frequência razoável, finalmente contribuindo pra que ele entenda as emoções humanas e enfim, vocês assistiram Dexter. E já que começamos com as comparações, eu não sei se todo mundo copia o Batman hoje em dia ou a relação entre heróis/vilões sempre foi assim e o Nolan só jogou na nossa cara, mas o Moriarty é incrivelmente parecido com o Coringa. O que nem é ruim, já que ele mesmo se diverte com o papel de supervilão e acaba dando uma complexidade maior ao personagem.
Outro grande mérito do seriado é a inserção de várias referências que fazem ligação com a obra do Conan Doyle, tipo o Watson ter um blog que transforma Sherlock numa especie de celebridade. Ou a transformação de Baskerville em uma base militar secreta. E até o clássico chapéu do detive, aqui vira marca registrada por acaso, depois de uma tentativa frustrada de se esconder da imprensa.
As atuações são igualmente bacanas, principalmente do Benedict Cumberbatch, já que o papel principal poderia facilmente ficar afetado demais. Palmas também pro Martin Freeman (O Bilbo, cara) que incrivelmente consegue impor respeito como Watson. É incrível também pensar em como a série já evoluiu em apenas duas temporadas (Seis episódios, lembrem-se). Tanto que é difícil imaginar algo que supere o clímax do último episódio (Que quem conhece os livros [Ou filmes] já pode ter alguma ideia do que se trata). E faz com que o tempo até a estreia da 3ª temporada, que começou a ser gravada nessa semana e deve acontecer só no final do ano, passe mais devagar ainda. Bom, mas vocês que tiveram a sorte de não assistir, aproveitem aí as primeiras 9 horas de Sherlock, enquanto eu vou lá descobrir mais uma série nesse meio tempo.
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