Tem que acabar o nerd (?)
terça-feira, 15 de dezembro de 2020 A maioria dos problemas que vemos no mundo nerd não está lá apenas por eles serem nerds, mas sim pelo mesmo motivo dos maiores problemas de tudo aquilo que tem como grupo majoritário o homem branco hétero: O privilégio. Machismo, racismo, homofobia, xenofobia e afins são encontrados em qualquer área. Porém, existem problemas específicos dos nerds que fazem com que esses ataques ganhem ainda mais espaço nessa comunidade. Talvez (E muito provavelmente) por homens brancos héteros terem sido durante tanto tempo os únicos nerds com visibilidade (Mas que novidade, né?). Tá, mas quais são esses problemas? Bom, como alguém que já foi esse nerd tóxico acho que posso apontar alguns desses problemas aqui. Vem comigo.
A privada não é só sua. Pare de cagar regra.
Um dos principais problemas dos nerds é acreditar que as coisas que ele gosta pertencem a ele e somente ele, o pedacinho especial de poeira cósmica, entendeu a obra, fazendo com que ele se torne o fiscal de cultura pop. Não sabe o nome do alienígena que apareceu 5 segundos no fundo da cantina de Star Wars? Devolve a carteirinha nerd. Curte quadrinhos mas nunca leu A Piada Mortal? Tira essa camisa da DC! Não tem essa obrigatoriedade não, tá? A pessoa pode ler lá os quadrinhos da Liga da Justiça ou do Miranha Homem-Aranha e não se interessar pelas “bíblia nerd” que cês pagam uma fortuna pra enfeitar prateleira (A gente já chega nesse ponto). A pessoa pode gostar de Star Wars e não saber o nome de todos os pilotos do esquadrão caralha a quatro de navinha da resistência. E você não tem poder nenhum pra autorizar ou desautorizar alguém a gostar de alguma coisa.
Enfia a lombada quadrada no cy, meu anjo!
Além disso, o nerd tem uma pegada bem elitista de ter produtos exclusivos e pagam uma fortuna por algo que acaba ficando inacessível pra a maioria do público. Sim, eu tô falando dos teus quadrinhos de lombada quadrada que brilham no escuro. Essa ideia de “só eu tenho a edição definitiva especial exclusivaça de O Cavaleiro das Trevas” só ajuda a alimentar a pirataria. E agora eu quero ter uma conversa com as editoras também. Chega mais.
Eu não vou pagar 100 reais em Watchmen ou 300 reais em Sandman. Não vou! Desculpa. “Ah, mas são clássicos, cê tem que ter”. Meu cu! Se eu baixar essas HQs eu compro uns sete quadrinhos independentes e ainda economizo uma grana. A gente têm aí uma cena de quadrinhos independentes nacionais que tá crescendo pra caralho justamente porque a galera se ligou que quadrinho não é só Marvel e DC. Enquanto essa babaquice de edição de colecionador continuar existindo eu vou continuar abraçando o tio Torrent e pau no olho das editoras. Eu nunca teria lido Sandman ou Watchmen até hoje se não fosse pela pirataria. Isso é elitizar a arte e aqui no Brasil a gente tem muito disso. Arte é pra elite.
Ah, mas é caro editar e lançar quadrinhos, cara. Cê tá falando merda!
Há grandes chances de você estar certo, mas vem comigo fazer uma conta rapidinho. As revistas saem nos Estados Unidos com 22 páginas, a Panini pega 3 edições dessa revista e junta em uma única revista – que conhecemos como mix – e vende por 9,90. Tão acompanhando? Watchmen originalmente tem 12 edições, sendo assim, no preço justo, as 12 revistas, saindo nesse formato da Panini, custaria 40 reais. É menos da metade do preço, meu chapa! E eu sei que tem material extra, tem introduçãozinha escrita por não sei quem, tem os esboços, altas frescurinha, mas por que caralhas não são feitas versões comuns dessas revistas? Porque se for acessível pra todo mundo o nerd para de ser especial e se tem uma coisa que o nerd evita entender é que ele não é especial.
As editoras não estão matando seus personagens, você é que é babaca.
Sempre que uma nova versão de um personagem surge o choro rola solto nas redes sociais. Como se agora que temos o Homem Aranha Miles Morales, o Homem Aranha Peter Parker não existisse mais. E não, você não é obrigado a gostar dessas novas versões, mas se você não leu e não gosta só por causa da diversidade que elas representam, você só tá sendo racista.
O que é bom e o que é ruim?
O fato de VOCÊ, estrelinha brilhante, não gostar de uma coisa, não faz com que ela passe a ser ruim. Do mesmo jeito que você gostar de alguma coisa não determina que ela é de fato boa. Você não é o detentor da verdade absoluta pra definir o que é bom e o que é ruim. Já ouviu falar em gosto?
“Você não entendeu”, não é resposta, Zequinha.
Não existe argumento mais bosta do que: “você não entendeu”. Se alguém não gosta, ou pelo menos não gosta tanto quanto a maioria gosta de alguma coisa, a primeira resposta é sempre “você não entendeu”. E às vezes isso pode até ser verdade, mas tembém é possível que a pessoa tenha entendido e simplesmente não tenha gostado. A não ser que você seja desses nerds que acha que o Homelander é o herói ou que o Império tava certo, aí você não entendeu mesmo. E se você quiser ser um fascistinha de merda que torce pro Homelander ou pro Império, vai lá, só não distorce o que é mostrado no material pra tentar convencer os outros que você tá certo, até mesmo porque você não tá.
Tá, mas e aí? Tem que acabar o nerd?
Eu acredito que não. Até mesmo porque são os nerds que produzem as séries, filmes, quadrinhos, livros, games e uma infinidade de entretenimento que consumimos. O que precisa acabar é a arrogância nerd. O meu conselho é que saiam da bolha de criadores brancos héteros e ouçam mais o que outras pessoas têm a dizer sobre a cultura pop. Se ficou ofendido com alguma coisa que alguém disse, pensa um pouco se você se ofendeu porque a pessoa tá falando groselha ou porque você é babaca e não gosta de ouvir umas verdades. Mudar não é fácil, mas é bem melhor quando você passa a entender e respeitar opiniões diferentes da sua e nota que não é centro do universo nerd (Ou de qualquer outro universo mesmo).
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