The Path, mais um acerto da Hulu
Não há dúvida que cultos/religiões como a Cientologia e Mormonismo estão nas cabeças. Especialmente a primeira, que está novamente sob os holofotes graças à série da atriz e ex-praticante Leah Remini para a A&E, Scientology and The Aftrermath, que foi renovada para uma segunda temporada e explora os abusos e absurdos cometidos pela igreja liderada por David Miscavige e o documentário My Scientology Movie, de Louis Theroux, gravado em 2015, e que está bombando nos festivais de cinema. Um filão a ser explorado.
A Hulu, que não é trouxa e está buscando seu lugar ao sol, não marcou bobeira e fez um golaço produzindo o drama original The Path, estrelado por Aaron Paul, ex-Jesse Pinkman de Breaking Bad e Hugh Dancy, mais conhecido por dar vida a Will Graham em Hannibal. Tem ainda o doppelganger do Heath Ledger em 10 Coisas que Odeio em Você, para deixar a experiência ainda mais sensacional.
The Path conta sua história a partir da perspectiva da tradicional família Lane, composta pelos membros do Meyerismo – religião fictícia da série – Eddie (Aaron Paul), Sarah (Michelle Monaghan), Hawk (Heath Ledger Kyle Allen) e a caçula Summer (Aimee Laurence). De todos, o único que não nasceu no movimento foi Eddie que, logo no começo da série, durante a cerimônia em que deveria atingir um novo degrau d'”A Escada”, se decepciona ao descobrir um segredo que soterra suas crenças e, pouco a pouco, suas relações familiares.
Se Eddie cativa a empatia do público, apesar de ser um tanto quanto unidimensional (Por enquanto), assumindo o papel do típico marido bacana e pai herói, que vai lutar para reunificar sua família, o líder não-oficial do Meyerismo, Cal Roberts (Hugh Dancy), é um personagem fantástico. Eu, que assisti algo de Hannibal, demorei a reconhecer Dancy, que não apenas se transmuta imediatamente, assumindo a persona interessante de Roberts, mas também porque sou uma péssima fisionomista e ele está sem barba e de cabelo cortado. Com seus demônios e ambições, as nuances são infinitas. Ao mesmo tempo em que almeja poder, mais do que dinheiro, ele acredita na religião e está disposto a lutar por ela a qualquer custo. Procura se manter em castidade, nutrindo uma paixão de adolescência por Sarah – que espera realizar um dia – mas recorre à ex-viciada recém-chegada alojamento Mary Cox (Emma Greenwell) para aliviar seus impulsos sexuais. É impossível colocá-lo em uma caixinha do bem ou do mal. Ele é mau caráter, sim, mas não só mau caráter. Essa humanização de um personagem tão controverso só é possível pelo ótimo trabalho que Hugh Dancy faz. E, por mais que eu me repita falando isso, é o grande trunfo da série.
Sarah, por sua vez, envolvida em um quadrilátero amoroso com a religião, Cal e o marido, é o estereótipo da esposa chata que marcou Skylar em Breaking Bad, Diana Rayburn (Jacinda Barrett), do meu tesouro, Bloodline, e Catelyn Stark (Michelle Fairley). Sua infelicidade é constante e não há nada que possa ser feito a respeito. Talvez seja um paralelo com a prisão que sua crença se tornou. E por mais que Eddie atravesse todos os programas do Meyerismo para se purificar de erros que sequer cometeu, por pura exigência da mulher, sob a promessa de perdão e recomeçar sobre as bases sólidas que definiram a união. Incapaz de perdoar, ela simplesmente não consegue deixar de ser uma pessoa ruim, enxergando o pecado em todos e convenientemente cega para os próprios. Interessante que a pessoa de maior caráter seja vista, pelas “pessoas de deus”, como o grande vilão da história. Ótima crítica e reflexão para o comportamento dentro de religiões, cultos, ou qualquer movimento que fale em nome do “sagrado”.
Se a primeira temporada é uma bola de neve rumo ao desastre que virá a se tornar a vida dos protagonistas, a segunda é menos previsível, mais movimentada, cheia de plot twists e bastante coerente com a abordagem narrativa, que não deixa a desejar. Se é natural que a produtividade caia ao longo do tempo, The Path parece se sair bem em seus dois primeiros anos. Dizem os criadores que o melhor está por vir. Por enquanto, só desejo vida longa ao Meyerismo e que a Hulu desembarque logo em solo brasileiro. Amém? Amém.